Megatendências / Biorrevolução

Avanços recentes no uso da genômica e melhoramento de precisão

 

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A utilização de sequenciadores de última geração e poderosos programas de bioinformática e modelagem computacional, para caracterizar diferentes bancos de germoplasma3Germoplasma: recursos genéticos vivos, como sementes ou tecidos, mantidos para fins de criação, preservação e outros usos de pesquisa de animais e plantas., é uma alternativa fundamental na criação de bancos de caracteres que possam ser explorados por cientistas no futuro e que deve, portanto, ser amplamente entendida e institucionalizada. 

Em espécies vegetais de valor econômico (soja, milho, trigo e algodão), isso já vem sendo feito por grandes empresas privadas com investimentos bilionários. Por sua vez, uma maior exploração da biodiversidade brasileira ampliará a fonte de novos genes, rotas metabólicas e estratégias de adaptação que poderão ser biotecnologicamente transferidas (via transgenia ou edição genômica4A edição genômica é o processo pelo qual a sequência do genoma é alterada por meio da intervenção de uma quebra de DNA ou modificação do DNA.) a culturas agrícolas e florestais de forma a garantir a independência nacional para desenvolvimento de produtos agrícolas e industriais sustentáveis e de alto valor agregado (Adli, 2018). Sobretudo aplicados a espécies animais, mas também a espécies vegetais, estudos de associação genômica ampla e fenotipagem em larga escala poderão viabilizar a identificação de alelos favoráveis em populações e genótipos adaptados a estresses relevantes nos biomas brasileiros, visando a sua subsequente reprodução por meio de edição genômica em genótipos elite (Tardieu et al., 2017). 

Uma plataforma de gênomica de espécies nativas brasileiras e populações adaptadas aos nossos biomas deverá ter como alvo principalmente características de interesse direto para a agricultura, pecuária, indústria e medicina. A participação da Embrapa deverá ser concentrada em recursos genéticos de alto valor agregado, produtos pré-tecnológicos e tecnológicos, know-how tecnológico e em bancos de dados e de informação de espécies da biodiversidade brasileira capazes de contribuir com caracteres envolvidos na adaptação a estresses bióticos e abióticos, assim como caracteres envolvidos na melhoria da eficiência produtiva e da qualidade nutricional de alimentos ou que agreguem valor aos produtos agrícolas e industriais.  

Um dos exemplos deverá ter foco nos cenários de mudanças climáticas. As organizações públicas de pesquisa e desenvolvimento deverão aumentar esforços na busca de espécies e populações vegetais adaptadas aos biomas do Cerrado e da Caatinga, a identificação de genes e rotas metabólicas candidatas e incorporá-las em linhagens/cultivares comerciais, visando à adaptação e à estabilidade produtiva em condições de estresse hídrico e térmico. Para que essas estratégias sejam rapidamente testadas, deveremos ser capazes de obter e fenotipar, em larga escala, os genótipos transformados e editados, caracterizando-os agronomicamente em condições de campo e em ambientes que simulem cenários previstos de mudanças climáticas. Com as novas tecnologias e métodos de fenotipagem de plantas, há a tendência na melhoria do ganho genético (Gy). Somente com uma poderosa estrutura de biologia de sistemas5Biologia de sistemas é o ramo da biologia preocupado com a análise computacional e matemática de sistemas biológicos complexos. É um campo interdisciplinar que combina elementos da teoria de sistemas e matemática aplicada com biologia teórica, com o objetivo principal de descobrir e modelar as propriedades emergentes de entidades biológicas em interação., ferramentas de bioinformática e de algoritmos computacionais que integrem todos os dados gerados nos diferentes níveis de organização biológica, será possível identificar variabilidade nas sequências gênicas ou regulatórias que possam estar relacionadas a mecanismos de adaptação climática. 

O germoplasma utilizado nas variedades brasileiras depende cada vez mais de tecnologias com propriedade intelectual que não pertencem a empresas públicas ou privadas nacionais. Mesmo com a abertura do mercado brasileiro de sementes, é estratégico para o País que a Embrapa e outras organizações públicas de C&T mantenham a sua presença nesse mercado. Além de trazer ao produtor e à sociedade brasileira tecnologias que inicialmente não seriam desenvolvidas por interesse de empresas de capital privado, poderá auxiliar na manutenção dos preços em casos de desequilíbrios de mercado.  Os cientistas precisarão rapidamente adquirir e utilizar esse conhecimento para prover maneiras inovadoras de modificar processos moleculares, celulares e fisiológicos vegetais, adicionar novas características e controlar a expressão gênica, a fim de desenvolver germoplasma com características próprias de maior produtividade, tolerância a estresses, qualidade nutricional, entre outras características de interesse. 

O uso prático da informação genética contida na biodiversidade brasileira para vencer os desafios complexos do agronegócio será um paradigma a ser quebrado nas próximas décadas. A rápida evolução das tecnologias na genômica e na edição gênica nos colocará em um momento único na história da humanidade, pois independentemente do organismo, teremos condições de melhorar de forma precisa, rápida e razoavelmente barata, características de interesse importantes para o agronegócio. 

No futuro, o sequenciamento de coleções inteiras de germoplasma presentes em bancos de germoplasma e a associação com fenótipos devem ser um componente primário para todos os programas de melhoramento genético (Varshney et al., 2020).

Referências

ADLI, M. The CRISPR tool kit for genome editing and beyond. Nature Communications, v. 9, n. 1911, 2018. DOI: https://doi.org/10.1038/s41467-018-04252-2.

TARDIEU, F.; CABRERA-BOSQUET, L.; PRIDMORE, T.; BENNETT, M. Plant phenomics, from sensors to knowledge. Current Biology, v. 27, n. 15, p. R770-R783, 2017.

VARSHNEY, R. K.; SINHA, P.; SINGH, V. K.; KUMAR, A.; ZHANG, Q.; BENNETZEN, J. L. 5Gs for crop genetic improvement. Current Opinion in Plant Biology, v. 56, p. 190-196, 2020.