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A Embrapa e a pesquisa em Mato Grosso, um esclarecimento

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A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, vinculada ao Ministério da Agricultura e do Abastecimento, vem, por meio desta nota, esclarecer à sociedade do Estado do Mato Grosso, especialmente àqueles setores diretamente envolvidos com o agronegócio, os fatos que resultaram no rompimento de sua parceria com a Fundação Mato Grosso - FMT. A decisão foi tomada após longo período de negociação, durante o qual a Embrapa sempre se manteve fiel ao compromisso de assegurar os interesses nacionais. Na oportunidade, esclarece também os principais pontos dos contratos de cooperação técnica e comercial firmados com a Monsanto, na área de biotecnologia.

A Embrapa e o melhoramento genético vegetal

A Embrapa trabalha há 27 anos com o objetivo de viabilizar soluções para que o Brasil tenha um agronegócio competitivo, inserido em uma economia global, e sustentável, capaz de atender às necessidades tecnológicas, ambientais, econômicas e sociais das gerações atuais e futuras.

Na área de sementes, um dos seus desafios é contribuir para que o Brasil detenha competência tecnológica, de forma a fortalecer as empresas nacionais, notadamente aquelas inseridas nesse mercado. Nessa linha, investe maciçamente em programas de melhoramento genético, que representam a coluna vertebral das atividades de pesquisa vegetal conduzidas pela Empresa e mobilizam grande número de pesquisadores.

São esses programas de melhoramento que tratam da variabilidade genética, cujo objetivo é a transferência e o cruzamento de características importantes ou desejáveis de plantas para obtenção de cultivares com maiores qualidades nutricionais, mais resistentes a pragas e a doenças e mais adaptadas às diversas condições de clima e solo.

Os programas de melhoramento genético desenvolvidos pela Embrapa, em parceria com outras instituições, permitiram ao Brasil saltos tecnológicos expressivos. No caso da soja, por exemplo, tornaram possível a expansão e a maior regionalização do seu cultivo, favorecendo a produção em quase todo o país. Outros exemplos são os do milho e do trigo, cultivados com sucesso nos cerrados, vencendo barreiras de solos ácidos e de baixa fertilidade.

Esses mesmos programas trazem vantagens competitivas e agregam competência estratégica a um país que é hoje referência em tecnologia agropecuária para os trópicos, principalmente na área de grãos.

Sobre parcerias

Parceria com instituições públicas e privadas é um princípio básico na ação da Embrapa. Ao todo, são mais de 1500 convênios e contratos em vigor envolvendo empresas públicas de pesquisa e de extensão, prefeituras e secretarias de agricultura, universidades, cooperativas, sindicatos, ONGs, associações, fundações e empresas privadas.

Fundações privadas de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento e de produtores de sementes tornaram-se parceiras importantes. Atualmente são muitas as fundações que mantêm convênios e contratos com a Embrapa.

Entre as parcerias com fundações, merecem destaque especial aquelas voltadas para agilizar os programas de melhoramento genético de grãos conduzidos pela Embrapa, uma vez que conferem maior capilaridade às ações da Empresa, fazendo com que seu trabalho esteja presente nos pontos do país onde seria oneroso manter infra-estrutura própria. São oito fundações no Brasil que, com outros parceiros, compõem uma rede de pesquisa na área de melhoramento.

Normas de parceria na área de melhoramento

Para regular melhor suas parcerias, e de acordo com a Lei de Proteção de Cultivares promulgada em 1997, a Embrapa editou normas estabelecendo que os parceiros envolvidos em programas de melhoramento genético conduzidos pela Embrapa não podem possuir programas próprios de pesquisa nessa área ou trabalhar em conjunto com organizações que tenham esses programas. Tal exigência justifica-se pela preocupação da Embrapa em evitar mistura dos resultados dos programas de melhoramento e perda do controle de informações. Outra preocupação é evitar que as empresas transnacionais de biotecnologia venham a controlar o germoplasma que hoje se encontra sob o domínio de instituições públicas como a Embrapa, por meio da aquisição de empresas nacionais de sementes que tenham acesso ao programa de melhoramento genético dessas instituições públicas.

As normas prevêem, ainda, que a Embrapa detém a titularidade exclusiva das cultivares geradas, uma vez que o material genético original é por ela alocado e porque são também seus pesquisadores que definem e realizam os cruzamentos e orientam as demais etapas do melhoramento genético que levará às novas cultivares. A titularidade exclusiva é necessária para que a Embrapa tenha o controle sobre o material genético e, com isso, possa ampliar o seu poder de negociação junto aos seus parceiros, sejam eles empresas transnacionais ou brasileiras, o que é fundamental para o fortalecimento da indústria nacional de sementes.

Os parceiros, que recebem o material genético da Embrapa e desenvolvem, sob sua supervisão, as fases de testes em diversas regiões, têm exclusividade na exploração comercial por períodos que variam de oito a dez anos, dependendo do grau de sua participação. Essa exclusividade assegura-lhes o ressarcimento dos investimentos feitos.

A parceria entre a Embrapa e a Fundação Mato Grosso

A Fundação Mato Grosso - FMT trabalhou em parceria com a Embrapa especificamente com soja (a partir de 1993) e algodão (a partir de 1997). A parceria foi produtiva, contribuindo para o desenvolvimento de muitas cultivares e melhoria do nível tecnológico da agricultura, especialmente no Estado do Mato Grosso.

Como resultado dessa parceria, foram desenvolvidas várias cultivares de soja, chegando a Fundação Mato Grosso a obter três cultivares em co-titularidade com a Embrapa (Uirapuru, Crixás e Pintado). Esses casos de co-titularidade foram definidos em contrato firmado antes da promulgação, em 1997, da Lei de Proteção de Cultivares. A promulgação dessa Lei obrigou a Embrapa a editar as normas de parceria citadas anteriormente

No caso do algodão, o trabalho executado em parceria com a Fundação Mato Grosso foi coordenado pela Embrapa Algodão, unidade da Empresa em Campina Grande (PB). Os materiais genéticos melhorados foram desenvolvidos em Mato Grosso, a partir de germoplasma da Embrapa cruzado nesse Estado ou na Paraíba. Além disso, a exemplo do que ocorreu com a soja, a Embrapa aportou melhoristas e outros especialistas, responsáveis pelo desenvolvimento das novas cultivares, disponibilizando, ainda, equipamentos e infra-estrutura.

Todo programa de melhoramento utiliza germoplasma básico ou cultivares de domínio público oriundos de diversas partes do mundo. A competência da pesquisa está em obter cultivares produtivas adaptadas a uma região, a partir desse material básico. No caso do algodão, a cultivar CNPA ITA 90, protegida em nome da Embrapa e que hoje ocupa 70% da área plantada no Estado, foi obtida pela Empresa dessa forma. Coube à Fundação Mato Grosso, nesse caso específico, coordenar a comercialização das sementes e credenciar os produtores.

O rompimento da parceria

A parceria entre as duas instituições foi rompida porque a Fundação Mato Grosso decidiu criar seu próprio programa de melhoramento genético de soja e algodão, o que contraria as normas adotadas pela Embrapa.

Em nenhum momento, outras parcerias firmadas pela Embrapa, seja com empresas transnacionais ou nacionais, públicas ou privadas, interferiram no processo decisório que levou ao rompimento do contrato.

Posição das partes e propostas

Com o rompimento do contrato, a Fundação Mato Grosso propôs que todo o material genético resultante dos cruzamentos feitos pela Embrapa, em diversos estágios de desenvolvimento, fosse dividido entre as duas instituições. Isso significaria que a Fundação Mato Grosso passaria a deter uma cópia do banco de germoplasma melhorado, alocado pela Embrapa ao convênio.

A Embrapa, como empresa pública, não concordou com a proposta da Fundação Mato Grosso, por entender que esse material genético é um patrimônio estratégico para o país, desenvolvido com recursos da sociedade. Apenas para o desenvolvimento de projetos de pesquisa com soja e algodão, por exemplo, a Empresa aplica anualmente recursos da ordem de R$ 15,7 milhões e R$ 4,2 milhões respectivamente, o que, ao longo de 25 anos, representam investimentos da ordem de R$ 500 milhões. Soma-se a isso um patrimônio de cerca de um bilhão e meio de reais, representado por toda uma infra-estrutura que inclui modernos laboratórios, equipamentos de última geração, bem como um forte programa de capacitação de pesquisadores e intercâmbio internacional.

Especificamente na área de melhoramento genético, são aplicados anualmente R$ 5,4 milhões, no caso da soja, e R$ 1,9 milhão, no caso do algodão. Ao longo de 25 anos, isso representa investimentos próximos a R$ 200 milhões.

Assim, a Embrapa solicitou à Fundação Mato Grosso a devolução do material genético que estava em poder daquela Fundação em diferentes estágios de avanço de gerações e das respectivas informações técnicas. Propôs que a Fundação ficasse com o direito de exploração comercial, em caráter de exclusividade, das cultivares desenvolvidas durante a parceria, considerando essa a remuneração justa e suficiente para o investimento feito pela Fundação.

No entanto, após dois meses e várias tentativas de negociação, não houve entendimento entre as partes, o que levou a Embrapa a ajuizar duas ações de seqüestro, obtendo decisão favorável na Justiça Federal, que determinou à Fundação Mato Grosso a entrega do material genético (germoplasma melhorado), tanto de soja quanto de algodão, à Embrapa. A decisão judicial foi cumprida.

A Embrapa já iniciou entendimentos com outros parceiros para dar continuidade ao programa de melhoramento no Estado, visando honrar seu compromisso com os produtores de Mato Grosso e com o desenvolvimento do agronegócio no Estado.

Contratos da Embrapa com a Monsanto

Em 1997, a Embrapa firmou contrato de cooperação técnica com a Monsanto, obtendo assim suporte legal para conduzir pesquisa de avaliação de eficiência do gene e da construção gênica da soja resistente ao herbicida à base de glifosato. Por meio desse contrato, a Embrapa concluiu que essas tecnologias da Monsanto são eficientes tecnicamente.

Com base nos resultados obtidos, a Embrapa decidiu desenvolver cultivares de soja transgênicas resistentes a herbicida à base de glifosato, QUE SERÃO PROTEGIDAS EM NOME EXCLUSIVO DA EMBRAPA.

A partir dos resultados das pesquisas desenvolvidas no âmbito desse contrato, os agricultores brasileiros poderão ter acesso a um produto mais competitivo no mercado, caso optem pelo uso da soja transgênica.

O contrato de cooperação técnica com a Monsanto não impede a Embrapa de negociar com diferentes empresas a incorporação de outros genes nas cultivares oriundas de seu programa de melhoramento. A única restrição, que obedece inclusive às normas de biossegurança, é a não incorporação de outro gene de resistência a herbicida na cultivar que receber o gene de resistência ao glifosato. Uma mesma cultivar convencional poderá, portanto, receber outros genes de resistência a herbicida. Assim, a partir de uma cultivar X convencional, pode-se obter uma cultivar transgênica resistente a glifosato e uma outra cultivar transgênica resistente a outro herbicida.

Após a cooperação técnica entre as duas empresas, foi assinado em março de 2000 o contrato comercial que possibilitará à Embrapa, em estrita observância à legislação vigente, colocar no mercado as suas cultivares de soja transgênica. Para tanto, é necessário que os parceiros indicados pela Embrapa assinem com a Monsanto um contrato de licenciamento para uso comercial da tecnologia Monsanto, uma vez que a mesma está protegida, no Brasil, por uma patente e dois pedidos de patente depositados junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI.

O projeto de desenvolvimento de cultivares de soja transgênica, à semelhança do de soja convencional, deverá ser realizado em parceria com produtores de sementes e fundações. Nos termos do contrato estão previstas as responsabilidades de todas as partes envolvidas.

Todas as cultivares transgênicas obtidas pela Embrapa serão protegidas em nome exclusivo da Embrapa, com fundamento na Lei de Proteção de Cultivares. A tecnologia da Monsanto, representada pela construção gênica, já está protegida em seu nome no Brasil com fundamento na Lei de Propriedade Industrial (Patentes).

É importante ressaltar que todo o processo para a obtenção da soja transgênica seguirá a metodologia usualmente adotada nas pesquisas de melhoramento genético realizadas nas diversas regiões do país. Ou seja, o material vegetal avançado será distribuído aos parceiros para que estes, sob supervisão da Embrapa, possam efetuar os testes de valor de cultivo e uso (VCU), necessários para registrar a semente comercial.

A Embrapa licenciará diversas empresas de produção de semente. Estas multiplicarão a semente básica, produzindo, dessa forma, semente comercial, que será vendida aos agricultores. Os agricultores poderão, de acordo com a Lei de Proteção de Cultivares, guardar grãos para uso próprio em novos plantios.

Os produtores de semente licenciados individualmente pela Embrapa, após assinarem o contrato de licenciamento com a Monsanto, pagarão royalties à Embrapa pelo uso da cultivar protegida em seu nome. A Monsanto receberá dos produtores de sementes parceiros da Embrapa uma taxa pelo uso de sua tecnologia, protegida com amparo na Lei de Propriedade Industrial, valor que será negociado entre os produtores de sementes e a Monsanto e que não pode ser superior ao cobrado pela Monsanto de seus parceiros que venham a produzir as cultivares desenvolvidas pela sua subsidiária no Brasil (Monsoy).

Ressalta-se que mais de 90% do programa de melhoramento da soja desenvolvido pela Embrapa é voltado à soja convencional. É baixa a participação de material transgênico. A Embrapa não deixará de gerar tecnologia para a soja convencional.

Os parceiros da Embrapa, produtores de semente, que ajudam a desenvolver e a multiplicar cultivares e sementes de soja, terão resguardado seu direito de opção entre a adoção da soja transgênica ou da convencional. Caso optem pelo uso da transgênica, terão assegurado seu direito de serem licenciados pela Monsanto para uso da tecnologia da Monsanto inserida na cultivar da Embrapa.

Um produtor de semente, parceiro da Embrapa, só deixará de participar do programa se não cumprir com os compromissos assumidos de pagamento de royalties à Embrapa e da taxa tecnológica à Monsanto, tornando-se inadimplente, como em qualquer outro contrato comercial.

É importante ressaltar também que os produtores de soja que usarem as variedades transgênicas desenvolvidas pela Embrapa poderão usar qualquer herbicida cujo princípio ativo seja o glifosato, hoje de domínio público, desde que o produto seja registrado no Ministério da Agricultura para utilização em pós-emergência.

Estrategicamente, entende-se que o Brasil deve aprofundar seu conhecimento científico na área de biotecnologia, enquanto a sociedade decide se adota ou não a nova tecnologia. Para isso, a Embrapa vem desenvolvendo um programa próprio de isolamento, caracterização de genes e transformação de plantas, reduzindo a dependência brasileira, já que os genes e os processos de construção gênica atualmente usados na obtenção de plantas transgênicas pertencem a grandes empresas transacionais.

Pontos importantes do contrato

a) A Embrapa não está licenciando seu germoplasma para a Monsanto. Ao contrário, é a Monsanto que está licenciando sua tecnologia para a Embrapa. Assim, todo o germoplasma e as cultivares (inclusive as transgênicas) são de propriedade exclusiva da Embrapa.

b) Os parceiros da Embrapa (produtores de semente), na produção de soja convencional, como as fundações, se quiserem, serão parceiros também na produção da soja transgênica. Esses parceiros não podem ser recusados pela Monsanto.

c) A proteção exclusiva significa que a Embrapa é que decidirá o quê e onde produzir, quanto produzir e quem deverá produzir.

d) A taxa tecnológica a ser negociada e cobrada pela Monsanto dos parceiros da Embrapa não pode ser maior do que a cobrada de outros parceiros diretos da própria Monsanto.

e) Continua assegurado, de acordo com a Lei de Proteção de Cultivares, a qualquer agricultor guardar sementes para uso próprio em novos plantios.

f) A Embrapa mantém programa de melhoramento da soja convencional e acordos de pesquisa com outras empresas de biotecnologia visando criar alternativas para os produtores.

Considerações finais

1 - A Embrapa entende que, por meio das normas adotadas e da revisão dos seus contratos, está zelando pelo germoplasma, que é um patrimônio estratégico da sociedade brasileira.

2 - Esse germoplasma é um instrumento fundamental de negociação pois, sob domínio de uma instituição pública como a Embrapa, permite dar suporte e fortalecer a indústria nacional de sementes, contribuindo para sua maior competitividade.

3 - É fundamental que se busque parcerias com empresas transnacionais que detenham tecnologia de interesse para o país, desde que seja garantido o controle, por instituições públicas como a Embrapa, do material genético.

4 - No que se refere ao agronegócio do Mato Grosso, a Embrapa entende que os interesses do Estado, dos produtores e da população devem estar acima de qualquer conflito. Por esta razão, iniciou negociações com o Governo do Estado e produtores que manifestaram interesse em trabalhar com a Empresa, visando dar continuidade aos seus programas de pesquisa e melhoramento de soja, algodão, arroz e outras culturas.  

Tema: A Embrapa\A Instituição 

Mais informações sobre o tema
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