01/01/03 |

Íntegra do discurso de posse de Clayton Campanhola

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Sinto-me extremamente honrado e entusiasmado por ter a oportunidade de participar da administração pública do Governo Lula e deste importante momento da vida política de nosso país.

Como bem expressou o presidente em seu discurso de posse, a sociedade brasileira deixou evidente, nas eleições de outubro, seu clamor por mudanças. Essa vontade de trilhar novos caminhos transformou-se na enorme esperança depositada no governo que ora se inicia. Esperança que, entre tantos sentidos, se traduz em romper barreiras para melhorar as condições de inserção de nossos produtos e serviços num mercado internacional de altíssima competitividade e, internamente, em vencer os desafios impostos pelo exacerbado desequilíbrio social presente e pela escassez de postos de trabalho nos mais diferentes setores econômicos.

Nesse cenário, o papel da Embrapa, como entidade pública de pesquisa, vai além da geração de tecnologias para o setor produtivo agropecuário visando ao aumento da produtividade e da competitividade do agronegócio, cabendo-lhe também contribuir para que as restrições socioeconômicas existentes no nosso meio rural sejam amenizadas ou até mesmo eliminadas.

É preciso que a Embrapa esteja atenta a que segmentos sociais do campo, excluídos do processo de desenvolvimento, recebam tratamento especial, que lhes possibilite resgatar sua dignidade e exercitar sua cidadania. Atenção especial também devem receber os recursos naturais, principalmente o solo e a água, pois são esses bens públicos que garantem a própria produção agropecuária e que são, acima de tudo, patrimônio da humanidade de hoje e do futuro.

Essas considerações nos levam a elencar as linhas mestras da Embrapa no governo Lula:

1 - Dar prioridade à agricultura familiar e à transferência de tecnologia a esse grupo de agricultores. Há cerca de 4 milhões e 140 mil estabelecimentos de agricultores familiares, que representam 85% do total de estabelecimentos rurais no brasil. Sua área total é de aproximadamente 107 milhões e 770 mil hectares, ou seja, 30% da área total. O valor bruto da produção da agricultura familiar corresponde a 38% da produção agropecuária. Das 17 milhões e 300 mil pessoas ocupadas na agricultura brasileira, 13 milhões e 800 mil, ou seja, 77% estão ocupadas na agricultura familiar. Esses números mostram a enorme importância desse grupo de produtores para a agricultura e para a economia nacional.

É preciso estimular a presença de parceiros que apóiem a Embrapa no trabalho de levar tecnologia e informação a esses agricultores.

2 - Incorporar a preocupação ambiental nas ações de Pesquisa & Desenvolvimento, pois há demanda crescente da sociedade brasileira pela preservação das áreas de risco de degradação e pelo uso conservacionista dos recursos naturais voltados para a produção agropecuária, principalmente no que diz respeito à quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Não se pode mais produzir degradando os recursos naturais!

3 - Apoiar os programas sociais do governo lula, com prioridade ao projeto Fome Zero, no sentido de que o desenvolvimento tecnológico possa contribuir para a produção de alimentos de qualidade a baixos custos e com apoio à incorporação de agricultores familiares e assentados da reforma agrária nesse processo. Não basta apenas produzir alimentos, é preciso erradicar a fome! Não basta apenas atingir safras recordes, é preciso distribuir renda! Não basta apenas ampliar a produtividade agropecuária, é preciso incorporar os excluídos do campo ao processo de desenvolvimento!

4 - Incorporar o conceito de multifuncionalidade do meio rural nas ações de Pesquisa & Desenvolvimento, uma vez que o meio rural brasileiro não é mais exclusivamente voltado para a produção agropecuária. Há uma série de atividades não-agrícolas, que incluem tanto aquelas de processamento da produção, como aquelas de turismo e lazer, que têm contribuído para gerar renda e emprego no meio rural, inclusive nas regiões mais remotas. É necessário, portanto, apoiar as novas oportunidades de renda do meio rural brasileiro, com foco nos agricultores familiares, assentados da reforma agrária e pequenos empreendedores rurais. O desenvolvimento de territórios rurais deverá considerar essa interação entre os setores econômicos locais, criando uma nova dinâmica em benefício da população local.

5 - Contribuir para o contínuo fortalecimento do agronegócio brasileiro. Em 2001, esse setor foi responsável por quase US$ 24 bilhões de vendas externas, ou seja, 41,2% das exportações do país, com um saldo positivo de US$ 19 bilhões. A agricultura e a pecuária brasileiras são altamente competitivas em termos convencionais, mas sem considerar custos ambientais. Por exemplo, o custo de produção da soja no estado de mato grosso representa apenas 53% do custo americano. Embora em geral gerem poucos empregos diretos por unidade de área, os dois setores têm considerável efeito multiplicador sobre as demais atividades econômicas. O desafio ainda persiste no sentido de melhorar a competitividade das commodities brasileiras no mercado internacional, considerando qualidade, características específicas para diferentes segmentos de mercado e rastreabilidade para certificação de origem dos produtos.

6- Melhorar a capilaridade e o controle social das ações de Pesquisa & Desenvolvimento, de modo que os resultados gerados sejam prontamente incorporados aos sistemas produtivos. Há necessidade de ampliar a participação da sociedade, de suas representações de interesses e dos movimentos sociais na definição das prioridades de pesquisa. Uma maior aproximação entre geradores e usuários da pesquisa aumenta as chances de sucesso na absorção e incorporação das tecnologias geradas e torna mais efetiva a contribuição às transformações necessárias para o desenvolvimento rural.

7- Construir arranjos institucionais locais entre organizações estaduais de pesquisa agropecuária, universidades, organizações de assistência técnica e extensão rural, organizações não-governamentais, sindicatos, cooperativas, associações, entre outros, por meio da implantação de projetos de Pesquisa & Desenvolvimento cooperativos voltados para situações específicas de um território ou de um determinado ecossistema. Será preciso implantar redes de agricultores experimentadores com vistas a consolidar os sistemas locais de produção, ampliar a capilaridade da pesquisa e tornar mais eficaz a adoção dos resultados gerados.

8- Desenvolver e validar práticas da agricultura orgânica e da agroecologia voltadas prioritariamente aos agricultores familiares, a fim de melhorar a sua renda e promover a sua inserção social no processo de desenvolvimento rural. Esta linha de atuação se justifica pelo crescimento do mercado mundial de produtos orgânicos à taxa de 25% ao ano, sendo que, em 2001, ele chegou a 24 bilhões de dólares. Estima-se que, em 2005, os produtos orgânicos corresponderão a 15% do total de alimentos consumidos no mundo.

Por sua vez, o mercado interno de produtos orgânicos é de aproximadamente 250 milhões de dólares anuais, tendo ocorrido aumentos anuais de consumo de 30% a partir de 1999. É preciso que a pesquisa agropecuária pública valide o conhecimento empírico acumulado pelos agricultores neste tema, ampliando as oportunidades de renda e a preocupação com a conservação dos recursos naturais.

9- Gerar informações e resultados científicos sobre impactos no meio ambiente e na saúde humana que podem ser causados por plantas e outros organismos transgênicos que orientem a tomada de decisões quanto ao seu uso adequado na agricultura. Enquanto esses resultados não forem gerados, deve-se adotar o "princípio da precaução", de modo que a biossegurança esteja garantida.

10 - Consolidar a atuação da Embrapa como um dos braços do ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento junto aos ministérios do Desenvolvimento Agrário, de Ciência & Tecnologia, do Meio Ambiente e, especialmente, junto ao Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome, de modo a viabilizar a adoção de práticas, tecnologias e sistemas de produção agropecuários orientados pelos princípios do desenvolvimento rural sustentável. Somente esta integração tornará possível atender com eficácia as demandas prioritárias das comunidades rurais! Para atacar todas essas prioridades, a Embrapa terá três vertentes de atuação, adotando sempre como diretrizes o atendimento aos seus diferentes beneficiários e o desenvolvimento rural sustentável.

A primeira vertente estará voltada às atividades de Pesquisa & Desenvolvimento direcionadas aos agricultores familiares, assentados da reforma agrária e pequenos empreendedores rurais, e que apóiem o seu fortalecimento e o desenvolvimento local. Nesse sentido, serão fortalecidos os sistemas locais de produção que não degradem o meio ambiente, de forma a criar condições para a entrada competitiva no mercado de produtos de alto valor cultural agregado. Com isso, pretende-se que a Embrapa tenha uma maior abrangência de ações voltadas para o combate à pobreza rural, apoiando o desenvolvimento daquelas que representem maior geração de renda e emprego no campo a partir dos agricultores familiares, assentados da reforma agrária e pequenos empreendedores.

A segunda vertente refere-se às atividades de Pesquisa & Desenvolvimento voltadas para as cadeias do agribusiness, das quais fazem parte todos os grupos de agricultores, pecuaristas e empreendedores rurais. O objetivo, além de desenvolver sistemas competitivos que amparem os segmentos exportadores e do mercado interno e agreguem valor aos produtos primários, é gerar empregos e desenvolver tecnologias que sejam ambiental e socialmente éticas.

E a terceira vertente consiste de pesquisas inovadoras em termos estratégicos que não gerem resultados de uso direto pelos agricultores, mas que contribuem para aumentar e aprofundar o conhecimento existente. Entre essas pesquisas incluem-se, por exemplo, métodos de monitoramento e avaliação de efeitos sociais e ambientais de tecnologias e processos produtivos e, ainda, estudos de apoio à formulação de políticas públicas para o desenvolvimento rural. Incluem-se também pesquisas para atender os compromissos internacionais assumidos pelo país nas diferentes convenções das Nações Unidas, tais como a da biodiversidade e a das mudanças climáticas.

Em resumo, a preocupação da pesquisa agropecuária deverá incorporar à produção e produtividade, questões que precisam ser mais enfatizadas como avaliação de impacto ambiental, geração de emprego e renda, valorização das mulheres e jovens do campo, retenção das famílias no campo e qualidade de vida da população rural. A inserção dessas questões é condição essencial para fazermos da Embrapa no Governo Lula, uma empresa inteiramente comprometida com a cidadania do homem do campo. Este é um desafio que vamos perseguir, mesmo que, para isso, seja necessário promover correção de rumos e implementar ajustes institucionais. Incorporar essas questões em cada projeto de pesquisa, fará da Embrapa no Governo Lula uma empresa plural, que atenda todos os grupos da sociedade rural. Uma empresa que atrele desenvolvimento tecnológico a geração e distribuição de renda no campo. Uma empresa com controle social, em que a comunidade rural participe intensamente das decisões de pesquisa que afetam sua vida.

Assumo o compromisso, perante todos os presentes, de trabalhar incessantemente para que esses aprofundamentos tão necessários ao momento atual da Embrapa sejam implementados de modo firme e responsável.

Muito obrigado!  

Tema: A Embrapa 

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
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