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Campina Grande terá primeiro pólo de reúso de água do Nordeste

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O primeiro Pólo de Reúso de Águas do Nordeste já está em fase final de implantação, no Distrito Industrial de Campina Grande-PB. O projeto, com financiamento do Banco Mundial, é coordenado pela Embrapa Algodão, unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em parceria com Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e a Agencia Nacional de Águas (ANA). Ele prevê a implantação de um sistema com capacidade de tratamento de 20 metros cúbicos por hora, captando exclusivamente a água coletada pelo emissário de esgotos da cidade.

A idéia do projeto é de que a água regenerada deverá ser destinada para uso industrial e para a irrigação de três hectares de lavouras de olerícolas, frutíferas, culturas de grãos, espécies florestais, pastagens e plantas ornamentais, que deverão consumir cerca de 480 metros cúbicos por dia ou 20 metros cúbicos por hora, dependendo das condições meteorológicas, das culturas plantadas e da técnica de irrigação aplicada.

"Hoje, em torno de 60% do esgoto sanitário urbano produzido na cidade de Campina Grande é lançado diretamente na rede pluvial, sem passar por qualquer tipo de tratamento", estima o pesquisador José Americo Bordini do Amaral, especialista em Agrometeorologia. A principal vítima desse processo acaba sendo o riacho Bodocongó, o mais importante córrego da cidade, que depois de absorver toda essa descarga sanitária, segue seu curso em direção à barragem de Acauã. "O consumo urbano de água tratada de Campina Grande, em produção normal, é de 1.250 litros por segundo, podendo-se estimar um retorno médio de 60% das águas residuais, com uma vazão aproximada de 750 litros por segundo", informa Bordini, lembrando também que mais de 95% da composição dos esgotos é de água.

Poluído dessa forma, o riacho Bodocongó viu surgir em suas margens, principalmente na periferia da cidade, diversos plantios irrigados, uma atividade com absorção expressiva de mão-de-obra e geração de alimentos para a população campinense, que, por conta do racionamento, deixou de usar as margens do açude do Boqueirão, passando a utilizar água de péssima qualidade higiênica, inclusive para cultivo de hortaliças. "Teoricamente, esse seria um caso de reúso indireto, pois essa água utilizada para irrigação provém de corpo receptor de águas residuais. Entretanto, em épocas de estiagem, esse receptor transforma-se em um esgoto a céu aberto, configurando, na prática, o reúso direto para irrigação, inclusive de hortaliças, impondo um problema sério de saúde pública", avalia o pesquisador da Embrapa.

Reutilização de efluentes

A poluição dos rios de Campina Grande só agrava a problemática de escassez de água da região, que acabou se transformando no principal fator limitante de desenvolvimento local. Um exemplo dessa realidade viveu a Embratex, obrigada a transferir parte de sua linha de produção para o Rio Grande do Norte exatamente devido a limitação hídrica em Campina Grande.

O grupo de trabalho que conduz a implantação do Pólo de Reúso de Águas, conta com a participação dos professores da UFCG, Vera Lúcia Antunes de Lima e Adrianus Cornelius van Haandel, além do pesquisador Aderaldo Souza, da Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna-SP). Os técnicos trabalham com o conceito de "substituição de fontes", como forma de liberar as águas de melhor qualidade para usos mais nobres, como o abastecimento doméstico, o que justifica a promoção de estudos voltados para a reutilização dos efluentes na indústria e na agricultura.

"Além de uma alternativa viável para aumentar a disponibilidade hídrica, a reutilização de efluentes, principalmente os de origem urbana, é uma forma efetiva de controle de poluição e preservação do meio ambiente, cujos benefícios estão associados aos aspectos econômicos, ambientais e de saúde pública", comenta Américo Bordini.

Campina Grande, considerada a mais importante cidade do interior do Nordeste, com uma população de 360 mil habitantes, juntamente com as cidades de Boqueirão, Queimadas e outras localidades circunvizinhas, são abastecidas pelo Açude Boqueirão. Esse reservatório encontrava-se no final de 1999 com 18 % de sua capacidade máxima nominal de armazenamento, que é de 535 milhões de metros cúbicos. Na situação de Campina Grande como em muitas cidades do Nordeste, a disponibilidade de água não pode ser garantida, devido a um desequilíbrio crônico entre a demanda de água e a disponibilidade de recursos hídricos.

O pólo, um projeto-piloto nessa área, terá potencial para reciclar 500 metros cúbicos de água por dia, o que daria para tratar esgotos produzidos por cerca de 5.000 pessoas. "A qualidade da água a ser utilizada e o objeto específico do reúso, é que irão estabelecer os níveis de tratamento a serem recomendados. Essa água deverá ser tratada adequadamente, de maneira a eliminar elementos indesejáveis, principalmente os materiais orgânicos biodegradáveis e os organismos patogênicos", destaca o pesquisador.

Para transformar o esgoto em águas de utilidade é necessário que se aplique um tratamento visando a eliminação dos vários elementos indesejáveis presentes na água residual e eventualmente, que se efetue a correção de outros parâmetros como por exemplo, a dureza, recomenda o parecer técnico elaborado pela equipe.Para recomendar o uso dos efluentes na agricultura, inicialmente, os pesquisadores devem comparar a qualidade da água recuperada com a água de superfície disponível. Outra precaução será identificar parâmetros prejudiciais na qualidade da água recuperada e, eventualmente, projetar e implementar sistemas de correção da qualidade dessa água. Será realizada também uma avaliação do custo do tratamento, levando-se em conta todos os processos necessários e o tamanho da planta de tratamento. Será medido o impacto do uso de água recuperada de esgoto no solo, nas culturas e nas águas subterrâneas, assim como do uso do lodo biológico gerado no tratamento, no solo, nas culturas e nas águas subterrâneas. O projeto vai mensurar, por fim, o valor de lodo biológico gerado no tratamento como insumo agrícola.

Com relação ao reúso da água para as indústrias, será feita comparação da qualidade da água recuperada e da água disponível na rede pública. Devem ser identificados e, se necessário for, projetados e implementados sistemas de tratamento de água que possam adequar a qualidade da água recuperada à qualidade necessária na indústria. O projeto também deve avaliar o custo do tratamento, levando-se em conta todos os processos necessários e o tamanho da planta de tratamento.

A Agência Nacional de Águas (ANA) anunciou o financiamento de R$ 6 milhões para o projeto, mas pequena parte dos recursos foram liberados. A primeira fase do projeto foi custeado com recursos da Embrapa, UFCG e ANA. "Essa iniciativa resultou no Subprograma de Desenvolvimento Sustentável de Recursos Hídricos para o semi-árido Brasileiro (PROÁGUA Semi-Árido), cujo objetivo geral é garantir a ampliação da oferta de água de boa qualidade para a região do Semi-árido Nordestino, com a promoção do uso racional desse recurso, de tal maneira que a escassez de água não continue a se constituir em fator que impeça o desenvolvimento sustentável da região", finaliza Bordini.

Como funciona o processo

O esgoto é interceptado num ponto da rede sanitária numa área cedida à Embrapa pela Prefeitura de Campina Grande, no distrito de Catingueira, a 10 quilômetros do centro da cidade. Numa caixa de concreto ele passa pela primeiro tratamento: peneiragem. Em seguida a água atravessa uma canaleta, onde retentores de metal fazem a barragem. Nesse percurso, os componentes sólidos mais pesados do esgoto vão ficando assentados no fundo dos canais de concreto. Alternadamente, duas caneletas vão sendo bloqueadas para que um funcionário faça o serviço de retirada dos resíduos pesados. Depois dessa etapa a água é coletada num segundo tanque de concreto, de maior capacidade e bombeada para quatro recipientes gigantes (reatores), onde vai ocorrer o processo de degradação da matéria orgânica.

Nos reatores, agentes biológicos (biota), como algumas espécies de bactérias, encontradas na água, fazem o trabalho de descontaminação, eliminando microorganismos nocivos, como ovos de helmintos e coliformes fecais. O tempo de retenção da água nos recipientes é de aproximadamente um mês, para a purificação da água em níveis próximos ao da potabilidade. O processo também produz gás metano, que será armazenado e poderá ser utilizado para geração da energia necessária para o funcionamento de parte do sistema.

Jornalista: Dalmo Oliveira (MTb/PB N.º 0598) Embrapa Algodão Telefone: (83) 315.4361 E-mail: dalmo@cnpa.embrapa.br  

Tema: Atividades Temáticas\Meio Ambiente 

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