01/01/04 |

Moçambique: um país de contrastes

Informe múltiplos e-mails separados por vírgula.

 

  Apesar de 75% da população de Moçambique, na África, viver no meio rural e depender exclusivamente do que produz para se alimentar, as técnicas agrícolas ainda são rudimentares, resultando numa produção insuficiente para alimentar seus 17 milhões de habitantes. A constatação é dos pesquisadores Rainoldo Alberto Kochhann e José Eloir Denardin, da Embrapa Trigo (Passo Fundo, RS) unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que desenvolvem, em Moçambique, um projeto de capacitação técnica em agricultura conservacionista, financiado pela FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação. O projeto, que conta ainda com a participação da Embrapa Solos e a colaboração da Fundação Pró-Sementes, da Epagri/SC e da Emater/RS, completa um ano em fevereiro, num trabalho de execução total previsto para 18 meses.

A exemplo do que acontece com a maioria dos países africanos, Moçambique enfrenta a privação gerada pela insegurança alimentar – carência de alimentos em quantidade e em qualidade – com a produção agrícola assolada constantemente por enchentes ou secas, cenário típico do clima tropical. Num breve momento de análise dessa afirmação, o leitor mais atento vai lembrar que o Brasil também vive sob clima tropical e, mesmo assim, desponta como o terceiro maior produtor mundial de grãos, o segundo na produção de frutas, e o primeiro na produção de carnes. Mesmo assim, é impossível fazer comparações. O Brasil tem 500 anos de história, enquanto que a independência de Moçambique aconteceu somente em 1975, contado com um território que representa apenas 10% do Brasil.

Em Moçambique, além de conflitos étnicos, a AIDS afeta 25% da população rural, que ainda vive em sistema de poligamia. A expectativa de vida do povo moçambicano situa-se abaixo dos 44 anos, acarretando falta de mão de obra no campo. As áreas agrícolas, exploradas pela típica agricultura de subsistência, possuem, em média, pouco mais de um hectare (1,1 ha), onde três milhões de famílias ainda cultivam a terra de forma rudimentar, isto é, sem máquinas e insumos.

É nesse cenário que o projeto capacitação técnica em agricultura conservacionista em Moçambique, está acontecendo, "sem a pretensão de resolver os problemas sociais do país, mas estendendo aos agricultores conhecimentos e ferramentas para o desenvolvimento", complementa o pesquisador, José Eloir Denardin. "A proposta do projeto consiste basicamente em promover o desenvolvimento da agricultura de Moçambique, com prioridade para a otimização do calendário agrícola, mediante rotação e consorciação de culturas, com base nos princípios da agricultura conservacionista", explica o pesquisador José Eloir Denardin.

Segundo o pesquisador, a capacitação teórico-prática está voltada, principalmente, aos técnicos moçambicanos que servirão de ponte para levar o conhecimento até os agricultores. "Para implementação do projeto, foi necessário avaliar os sistemas agrícolas produtivos vigentes no país, os equipamentos disponíveis, as espécies tradicionalmente cultivadas, as formas de cultivo, as características de clima e de solo e as tecnologias existentes. Seria insustentável tentar transferir tecnologias prontas do Brasil. Foi preciso adaptar nosso conhecimento à realidade de Moçambique".

Denardin lembra que a maior dificuldade enfrentada foi driblar a falta de insumos e de equipamentos básicos na agricultura. "Os insumos não são disponíveis e os equipamentos resumem-se a enxadas, foices e facões. Levamos do Brasil semeadoras manuais, como matracas ou saraquás, para ensiná-los a usar e mesmo a fabricar seus próprios equipamentos".

Para desenvolver o trabalho, foram implementadas seis unidades de treinamento e de demonstração (UTDs), distribuídas na região central do país. "UTDs são pequenas lavouras em que os extensionistas e os produtores rurais aprendem novas técnicas em agricultura praticando-as conjuntamente para, depois de dominá-las, demonstrá-las aos demais técnicos e agricultores", esclarece o pesquisador Rainoldo Alberto Kochhann, lembrado que  um dos grandes segredos de sucesso das UTDs é a escolha do produtor rural que, preferencialmente, deve ser inovador, comunicativo e exercer liderança junto à comunidade.

"Rodamos cerca de cinco mil quilômetros à procura de áreas apropriadas à implantação das UTDs". Cada UTD estabelecida conta com meio hectare (0,5 ha), no qual foram semeadas as culturas de milho e feijão, em consórcio, e planejada a semeadura de girassol, gergelim e trigo em seqüência. "Os modelos de produção projetados tiveram como objetivo primordial o emprego de espécies de subsistência da família e que apresentem potencial para a comercialização de excedentes", salienta Denardin.

O cultivo das espécies de forma desordenada é o principal motivo da baixa produtividade nas milhares de pequenas lavouras cobertas com milho, sorgo, feijão, mandioca, arroz. Todas as culturas são semeadas juntas, dividindo espaço numa mesma área. "Os agricultores não praticam a técnica de semeadura em linha. As sementes são depositadas em covas abertas aleatoriamente no solo de maneira rudimentar", lembra Denardin, ressaltando que promover a organização das espécies na lavoura e no tempo foi o primeiro desafio da equipe do projeto.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística de Moçambique, grande parte do contingente agrícola do país é composto por mulheres (80%), que cultivam a terra para garantir o sustento da família, enquanto os homens preocupam-se com a lavoura destinada ao incipiente mercado agrícola do país.

Resultados - Entre os resultados já alcançados pelo projeto estão a organização de modelos de produção que permitem obter, pelo menos, duas colheitas em uma única safra agrícola e a adoção do sistema plantio direto, com cobertura permanente do solo e mobilização somente na linha de semeadura. Um dos modelos de produção preconizado e implementado contempla feijão, seguido de milho, gergelim e trigo irrigado, voltado para a subsistência e comercialização do excedente. O relatório final do projeto deverá ser apresentado à FAO em 2005, quando os técnicos moçambicanos já estarão difundindo os conhecimentos adquiridos aos agricultores do país.

Joseani M. Antunes- MTb 9396/RS Embrapa Trigo Contatos: (54) 311.3444 - joseani@cnpt.embrapa.br  

Tema: A Embrapa\Cooperação Internacional 

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/