27/10/23 |

EnPI - Painéis destacam mercado de bioprodutos, bioeconomia e descarbonização

Informe múltiplos e-mails separados por vírgula.

Foto: Márcia Cristina de Faria

Márcia Cristina de Faria - Painel 1

Painel 1

O primeiro dia da 7ª edição do Encontro de Pesquisa e Inovação da Embrapa Agroenergia (VII EnPI), nesta terça-feira (24/10), foi bastante produtivo. Além da sessão de pôsteres, teve início a programação técnica do Simpósio Agroenergia em Foco, com três painéis de discussão abordando aspectos relacionados ao tema central do evento deste ano, que é “Bioeconomia e Agricultura”.

O primeiro painel, com o título “Análise de mercado: demanda, oferta e competitividade dos bioprodutos na economia sustentável” discutiu o mercado de bioprodutos, com suas ofertas, demandas e tendências. Participaram do painel Mário Cardoso, gerente de Recursos Naturais da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) (de forma on-line), Bruno Lucchi, diretor-técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Edsmar Carvalho Resende, conselheiro e diretor de Novos Negócios da Agrivalle e sócio-fundador da 10b, e Mateus Lopes, diretor de Transição Energética da Raízen. O moderador do debate foi Bruno Laviola, chefe-adjunto de Pesquisa & Desenvolvimento da Embrapa Agroenergia .

“O painel se concentrou em examinar a dinâmica da demanda e oferta dos bioprodutos e bioinsumos, bem como a competitividade que estes apresentam na economia sustentável. O contexto e as tendências atuais do mercado foram discutidos, permitindo aos participantes compreender como os bioprodutos e bioinsumos desempenham um papel crucial na busca por soluções sustentáveis que conduzam a um novo paradigma econômico, de baixo impacto. Acredito que este painel trouxe insights valiosos para todos os envolvidos na pesquisa, inovação e empresas relacionadas à bioeconomia e sua relação com a agricultura”, disse Bruno Laviola.

Em sua palestra, Bruno Lucchi disse que que há alguns tipos de bioprodutos que deve-se dar ênfase, como o algodão, os biocombustíveis e o etanol. “O Brasil hoje é o terceiro maior produtor de algodão do mundo e tem mercados como o Egito e a China. O grande desafio dessa cadeia, na visão do produtor, é o consumidor preferir um produto de algodão a um sintético. O produtor tem buscado as principais certificações e tem uma cadeia muito organizada, o desafio é o consumo”.

Em relação aos biocombustíveis, Lucchi disse que o Brasil é referência nesse tipo de combustível. “Nesse tema, o grande desafio que nós temos hoje é a ampliação da mistura do biodiesel no diesel. Atualmente essa mistura é de 12% e esperamos chegar em 15% em 2026”. Sobre o etanol, Lucchi lembrou que o Brasil tem hoje a maior frota de carros flex do mundo, com 40 milhões de carros, 27,7 bilhões de toneladas de etanol, sendo que desde número 6,1 já são oriundos do etanol de milho. “Esse é um importante exemplo de economia circular”, disse.

Mário Cardoso, por sua vez, iniciou sua palestra destacando aspectos relevantes da CNI, que é uma representação da indústria brasileira, agregando mais de 700 mil indústrias do país. Cardoso discorreu sobre um documento da CNI, de 2020, denominado “Bioeconomia e a Indústria Brasileira”, que tem a base do trabalho da entidade sobre o assunto. O trabalho conceitua bioeconomia como “geração de renda e riqueza a partir do desenvolvimento de produtos derivados de recursos biológicos com o uso de tecnologias inovadoras”. O documento aponta a bioeconomia como uma oportunidade de negócios e traz recomendações para impulsionar essa agenda no Brasil.

Segundo ele, a agenda prioritária da CNI engloba defender o posicionamento da indústria, assim como articular com o governo federal e partes interessadas em colegiados nacionais e comitês internacionais relacionados à biodiversidade e bioeconomia, elaborar e realizar cursos de capacitação sobre o marco legal da biodiversidade (Lei 13.123/2015) e articular com a base industrial para disseminação de metodologias utilizadas para avaliar impactos, dependências e riscos dos negócios sobre a biodiversidade, entre outros.

Cardoso também falou sobre o Plano de Retomada da Indústria. “É uma nova estratégia, focada em inovação, descarbonização, inclusão social e crescimento sustentável”, afirmou. Lançado pela CNI, o plano apresenta propostas para a reindustrialização do país, em bases modernas e alinhadas com as atuais demandas por sustentabilidade. “O Brasil deve mobilizar suas forças para colaborar com a construção de um mundo sustentável”, finalizou.

O terceiro palestrante do dia foi Edsmar Carvalho Resende, que iniciou sua fala perguntando ao público quem já tinha visto o solo no microscópio. Segundo ele, a pergunta já foi feita em locais onde há 15 milhões de hectares de soja plantada e nenhum produtor tinha olhado seu solo. “A gente fala só de carbono, mas existem outros ativos da natureza, como o solo e a biodiversidade”, citou.

Outro ponto abordado por Resende é que “o retrovisor hoje não serve de referência para nada”. “Temos o conhecimento tradicional e muito do que a gente está fazendo tem o passado como inspiração, mas ele não serve mais, pois estamos vendo o mundo se comportar de uma forma que nunca vimos antes. Essa transformação está acontecendo há mais de 50 anos”, disse ele, citando como exemplo o impacto que trouxe a fixação biológica de nitrogênio.

Em outro ponto de sua fala, Resende enfatizou que “agricultor não é apenas produtor de alimentos, é produtor de vida”. “Tem um nexo entre alimentos, saúde e bem-estar, com a vida gerando vida. São basicamente dois atributos: como vou proteger, por exemplo, o potencial genético das plantas, e o que eu posso agregar. Posso agregar, por exemplo, uma capacidade nutricional que vai suprir um déficit de alimento”, exemplificou.

Resende discorreu, também, sobre novas abordagens e novos modelos de negócio. Ele deu como exemplo a biofortificação de alimentos, que usa o iodo no sal para combater o bócio. Também foi abordada a decomposição de ativos agrícolas e de natureza, como a cadeia de óleos, com química verde e fina de alto valor agregado.

A última palestra do painel 1 foi de Mateus Lopes, que fez uma apresentação da empresa Raízen, referência em bioenergia e com amplo portfólio de produtos renovávels, com a produção de etanol, etanol de 2ª geração, bioeletricidade, biogás e bioprodutos.

 

Painel 2 - “Perspectivas e Tendências: Bioeconomia e Descarbonização"

O segundo painel do EnPI discutiu o assunto “Perspectivas e Tendências: Bioeconomia e Descarbonização" e teve a presença dos palestrantes Daniel Barcelos Vargas, coordenador do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas-FGV; Gonçalo Amarante Pereira, professor titular do Instituto de Biologia da Universidade de Campinas-Unicamp; Guilherme Soria Bastos Filho, coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas-FGV AGRO; Gerd Angelkorte, pesquisador do Laboratório Cenergia do Instituto Alberto Luiz Coimbra da Universidade Federal do Rio de Janeiro-COPPE/UFRJ; e Adriano Santhiago de Oliveira, coordenador-geral de Mudança do Clima e Agricultura Conservacionista do Ministério da Agricultura e Pecuária-Mapa. A moderação foi da pesquisadora da Embrapa Agroenergia Simone Mendonça.

“Foi um painel excelente, que trouxe boas discussões, questionamentos e levantamento de pontos críticos na questão da avaliação das métricas em relação à emissão de CO2 e à descarbonização. Com abordagens diferentes, mas complementares, o painel atingiu o objetivo proposto”, avaliou Simone Mendonça.

O palestrante Daniel Barcelos Vargas abriu o debate destacando o papel da bioeconomia para o Brasil do futuro que, segundo ele, muitas vezes passa despercebido, mas que tem cada vez mais relevância, à medida que o país abraça a transição verde e tenta investir em tecnologia, em produção e em comércio como uma rota para seu futuro.

“O que está na base dessa observação é a definição do que é verde. Nós queremos uma transição verde e a bioeconomia é o caminho para isso. Verde, contudo, não é somente uma cor, mas um conjunto de padrões de referência, de cálculo e de organização segundo os quais a gente observa as atividades econômicas e distingue quais são sustentáveis e merecem prosperar e quais não são”, explicou.

Sobre a descarbonização, Vargas disse que observou uma discussão sobre como o mundo deve agir para descarbonizar o comércio. “A grande questão é como considerar a pegada de emissão de um país. E a resposta é a NDC de cada país”, disse ele, referindo-se às metas de redução de emissão de gases de efeito estufa (GEE), chamadas de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês).

“Nós sabemos que todos os países, a partir do Acordo de Paris, a cada dois ou quatro anos têm que realizar o seu inventário de emissões, calculando todas as suas emissões e submetendo à base de registros da Organização das Nações Unidas (ONU). Essa base de emissões serve de referência para calcular como cada país tem provocado o impacto na atmosfera e, a partir daí, orientar a dinâmica de comércio de carbono”, afirmou o palestrante, referindo-se ao Acordo assinado em 2015 e que tem como objetivo principal não permitir que o planeta se aqueça além de 1,5°C até o final do século 21.

Na sequência, o palestrante Gonçalo Amarante Pereira discorreu sobre a desigualdade na distribuição da energia e na distribuição de renda. “O problema, muitas vezes, não é a falta de produção de alimento. É a falta de recursos para obtê-lo”, disse, lembrando que em alguns dos países onde mais se produz alimentos é onde mais existe a fome. “O problema não é a produção, mas o acesso ao alimento”, afirmou.

Pereira falou, ainda, sobre o programa Brave (Brazilian Agave Development), que visa desenvolver o agave, planta comum no semiárido nordestino, como uma nova fonte de biomassa produtiva e competitiva para a produção da bioenergia.

Dando continuidade ao painel, Guilherme Soria falou sobre melhorar as abordagens metodológicas em relação às pastagens degradadas e à agricultura de baixo carbono. Ele também citou a necessidade de se ter mais estatísticas sobre Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF), plantio direto e fatores de emissão de CO2 mais atualizados.

“Estamos em um momento em que sabemos que nós somos sustentáveis, trabalhamos bem as nossas atividades produtivas, mas está difícil de mostrar. Estamos sendo pautados, cada vez mais, por métricas internacionais e transformando as nossas atividades muito mais poluentes do que de fato elas são”, disse Soria.

Gerd Angelkorte, por sua vez, destacou que é necessário uma política forte para evitar o desmatamento. “Tem que parar com as pastagens degradadas”, alertou.

O palestrante afirmou, também, que o papel da atividade humana tem influenciado o balanço energético global. “Entre 1850 e 2020 o mundo aqueceu o mesmo que nos 1.400 anos anteriores (~1,09ºC). Entre 1850 e 2019 foram emitidas 2400+-240 Gt de CO2 antropogênico, sendo 42% desse montante emitido apenas durante os últimos 30 anos”, afirmou.

Angelkorte disse, ainda, que o Brasil tem um perfil de emissão de gases de efeito estufa (GEE) diferente do mundo. “Quando pensamos em mundo, os setores de Afolu (Agropecuária, Florestas e Outros Usos da Terra), energia e indústria são os principais responsáveis pelas emissões de GEE. No Brasil, os setores de Afolu e energia são os principais responsáveis pelas emissões de GEE”, explicou.

Finalizando, o palestrante disse que em cenários climáticos, tanto NDC quanto 1,5ºC, haverá oportunidades importantes para a penetração de novas tecnologias que envolvam a bioeconomia brasileira. “Para isso, é necessário aporte financeiro, investimento pesado tanto no setor agropecuário quanto no setor energético e industrial”, afirmou.

De acordo com Angelkorte, para alcançar todo o potencial enxergado nos cenários climáticos será necessário haver a produção de bioinsumos de baixo carbono, através do desenvolvimento de medidas tecnológicas e disruptivas no setor agropecuário. “Importante ressaltar a possibilidade de ganhos financeiros através da biodiversidade, o que ainda não é possível expressar em modelos de análise integrada, mas que é um grande potencial brasileiro”, concluiu.

Adriano Santhiago de Oliveira, encerrando, citou que o desmatamento não deveria ser da conta da agricultura, já que ele acontece de forma ilegal e não por causa do agro. “O desmatamento ilegal tem que ser combatido”, afirmou.

Oliveira também destacou que o Brasil tem vantagem em relação ao resto do mundo pelo fato de sua matriz energética ter uma contribuição forte de renováveis. “O último balanço energético mostra que, em 2022, 47% de nossa matriz energética foi de renováveis, contra 14% do mundo e 11,5% dos países mais desenvolvidos”.

Outro aspecto abordado pelo palestrante foi em relação à segurança alimentar. “Não tem como discutir a redução na emissão de gases de efeito estufa na agropecuária sem considerar a segurança alimentar, tanto do país como do mundo”, encerrou.

Ao final, após uma provocação da moderadora Simone Mendonça, todos falaram que falta uma governança em relação aos cálculos de descarbonização e de emissão de gases de efeito estufa e que é necessário um programa de Estado para o assunto. “A ideia dos palestrantes é que seja uma medida contínua, sem interferências políticas”, finalizou a pesquisadora.

 

Painel 3 - Políticas públicas

O tema do terceiro painel do Encontro foi "Políticas Públicas com Foco em Descarbonização e Sustentabilidade", moderado pela pesquisadora Patrícia Abdenur, chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agroenergia, que enfatizou na sua fala o quanto que a Unidade prioriza essa questão na sua programação. “Somente em 2023, a Embrapa Agroenergia já elaborou mais de 10 notas técnicas para diversas instâncias dos Poderes Executivo e Legislativo e do setor produtivo. É um trabalho importante para tanto para subsidiar políticas já existentes quanto para fomentar novos programas”, salientou.

O primeiro palestrante foi Marcelo Dourado, diretor do Departamento de Descarbonização e Finanças Verdes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Ele citou algumas das políticas públicas coordenadas pelo MDIC e as prioridades de curto e médio prazo estabelecidas, como a aprovação do Estatuto Legal do Mercado Regulado de Carbono, a nova formatação do Programa Nacional de Hidrogênio de Baixo Carbono (PNH2), o Plano de Neutralidade de Carbono da Indústria, a implantação do Selo Verde Brasil e do Programa Cidades Verdes, dentre outros.

Mas Dourado fez questão de enfatizar um ponto crucial na sua visão: “Não basta apenas o Estado e o setor produtivo fazer o seu papel. É preciso que o cidadão se torne mais consciente das suas escolhas e opte por soluções sustentáveis. Quem de nós continua abastecendo seu carro com gasolina, em vez do etanol, uma alternativa menos poluente e que contribui para a matriz energética renovável brasileira? A ação de cada um de nós é fundamental para mudarmos o consumo e consolidarmos mudanças sustentáveis na nossa sociedade”, finalizou.

Rafael Menezes, coordenador-geral de Tecnologias Setoriais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) apresentou também algumas políticas públicas coordenadas pelo Governo Federal e as principais diretrizes estabelecidas para a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação por meio da Portaria MCTI nº 6.998/23. Dentre os programas interministeriais citados estão o Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2), Combustível do Futuro, Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) e a Política Nacional de Bicombustíveis (RenovaBio).

Menezes também destacou a proposta de 10 Programas Estruturantes e Mobilizadores do Ministério: o Pró-Infra (de Recuperação e Expansão da Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica em Universidades e Institutos de Ciência e Tecnologia; o Mais Inovação Brasil (de Inovação para Reindustrialização em Bases Sustentáveis); o Conecta e Capacita Brasil (de Difusão e Suporte à Transformação Digital); o Integrado de Desenvolvimento Sustentável da Região Amazônica; o Conhecimento Brasil (de Repatriação de Talentos); o Política com Ciência (de Apoio a Políticas Públicas Baseadas em Conhecimento Científico); o Identidade Brasil (de Apoio à Recuperação e Preservação de Acervos Históricos e Culturais Nacionais); o de Apoio a Projetos Estratégicos Nacionais; o de Promoção da Autonomia Tecnológica na Área da Defesa; e o de Ciência, Tecnologia e Inovação para Segurança Alimentar e Erradicação da Fome.

O painel foi finalizado com Cid Caldas, coordenador-geral de Cana-de-açúcar e Agroenergia da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária, que iniciou sua apresentação com uma provocação: “Ouvimos aqui muitas e belas iniciativas tocadas pelas esferas do Governo de médio e longo prazos, como Hidrogênio Verde, biometano, biocombustíveis para aviação. Mas o que vocês, uma nova geração de cientistas brasileiros, estão fazendo mudar o dia de amanhã, no curtíssimo prazo? Também precisamos de iniciativas de curtíssimo prazo, porque os problemas que estão ocorrendo aqui e no mundo são graves e precisam de enfrentamento imediato”.

E finalizou sua fala com outra provocação: “Não aceitem o discurso falso de que a produção de biocombustíveis diminui a produção de alimentos no Brasil.  Essa é uma falácia que a Ciência brasileira já desmistificou, mas que de vez em quando ainda alimenta o discurso de alguns setores”.

Márcia Cristina de Faria (MTb 24.056/SP)
Embrapa Agroenergia

Robinson Cipriano
Embrapa Agroenergia

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

Galeria de imagens