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Ater digital e seus benefícios

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1. Introdução

Os serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) desenvolvem um trabalho de grande relevância para a agricultura brasileira, tendo como principal objetivo melhorar a renda e a qualidade de vida das famílias rurais por meio do aperfeiçoamento dos sistemas de produção, de mecanismo de acesso a recursos, serviços e crédito, de forma sustentável.

Embora a Ater tenha importância fundamental para o desenvolvimento do meio rural brasileiro, dados do Censo Agropecuário de 2017 apontam que somente 18,2% dos agricultores familiares brasileiros declararam ter acesso aos serviços de Ater, sendo que o acesso a esse serviço varia consideravelmente de acordo com a região: 48,9% no Sul, 24,5% no Sudeste, 16,4% no Centro-Oeste, 8,8% no Norte e 7,3% no Nordeste.

Considerando que a Ater nos moldes tradicionais tem se mostrado insuficiente para atender o imenso contingente de agricultores brasileiros, é necessário adotar novas estratégias de atuação capazes de aumentar o número de agricultores atendidos. Nesse sentido, as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) podem ser importantes aliadas no desenvolvimento de uma Ater que amplifique os resultados do trabalho dos extensionistas.

A expressão “Ater Digital” tem se propagado entre instituições e agentes técnicos, políticos e acadêmicos, de modo geral, quando estão se referindo ao uso de tecnologia digitais de informação e comunicação em atividades de extensão rural. Nas operações práticas e nas discussões teóricas referenciadas na atuação do serviço de Ater as palavras “digital”, “virtual” e “remoto”, por vezes, são admitidas com sentidos próximos ou complementares.

Em sua vida cotidiana, as pessoas no campo costumam utilizar as tecnologias digitais para os mais variados fins, como resolver de forma remota os problemas que surgem nas suas rotinas produtivas. Espera-se nos próximos anos um aumento da rede da internet nos territórios rurais brasileiros via acesso por telefone celular. Muitos produtores rurais, principalmente os da agricultura familiar, começaram a utilizar o caminho interacional dos aplicativos de mensagens instantâneas, como WhatsApp, para se comunicar diretamente com os técnicos de Ater, os fornecedores de insumos e, também, com os consumidores dos seus produtos, promovendo canais de venda direta para seu público no meio urbano.

Há alguns anos já se observa que boa parte das pessoas que trabalham e vivem no campo interagem em ambientes de comunicação virtuais pelos seus telefones celulares (80%) e possuem acesso à web nos seus domicílios rurais (65%). Elas se comunicam, principalmente, pelo aplicativo de mensagem Whatsapp (96%) e rede social Facebook (67%).


2. O que já mudou em direção à Ater Digital

Historicamente, propunha-se que a transferência de tecnologia e o extensionista de Ater fosse ao produtor rural de forma presencial, para prospectar ou implementar tecnologias, compreender e também ofertar conhecimentos científicos e tecnológicos. No entanto, nos dias atuais, o uso sistemático das redes sociais e de aplicativos de mensagens instantâneas, como Whatsapp, pelos técnicos e produtores já é uma realidade em boa parte dos territórios rurais brasileiros. Em que pese todo o histórico de trabalho e realizações da extensão rural, esta forma de trabalho que tem base em ações presenciais exige uma quantidade ampliada de técnicos extensionistas, de infraestrutura como escritórios e veículos e necessidades de recursos de custeio como manutenção de veículos e combustível. Pressupõe deslocamentos, seja do técnico ou do produtor, e desta forma impõem-se custos expressivos na atividade e ainda pode causar dificuldades de acesso, demora na ação e restrição da abrangência.

Sendo assim, os mecanismos mais antigos de extensão rural cederam lugar aos recursos e dispositivos de tecnologias digitais como a internet 4G/5G, computadores, celulares, smartphones, tablets, drones, chatbots, softwares e dispositivos eletrônicos que proporcionam um maior alcance na sua forma de ensinar, comunicar, partilhar e transmitir conhecimento e saberes. Os cadastros e as informações dos produtores rurais, cooperativas, associações etc., atualmente podem estar digitalmente organizados e podem ser acessados com poucos cliques a qualquer hora e a partir de qualquer lugar. Conforme a FAO, o smartphone se tornou uma ferramenta digital emergente para pequenos agricultores acessarem os serviços digitais de extensão rural.

Dados da FAO indicam que os serviços de extensão rural têm passado por uma rápida digitalização nas últimas décadas. Inovações digitais trazem novas oportunidades para entrega de tecnologias ao campo, incluindo a melhoria da acessibilidade a serviços em áreas geograficamente remotas, preenchendo as lacunas de informação entre os diferentes atores da cadeia de valor e contribuindo para o comércio justo e mercados inclusivos, inclusão social e financeira e outros.

Em todas as áreas e setores da economia e da sociedade a era digital está avançando e as atividades presenciais, os processos analógicos, estão evoluindo para os digitais. Também são evidentes os avanços em ferramentas e processos de relacionamento de profissionais e clientes. O agronegócio tem evoluído neste sentido e cada dia são mais comuns o uso de equipamentos e de tecnologias que visam a uma agricultura e pecuária com automação, com equipamentos e ferramentas modernos para a execução dos trabalhos, para a gestão das propriedades e ainda com acesso a informações mais rápidas e dinâmicas.

Essas tecnologias facilitam e agilizam a comunicação com as pessoas que vivem e trabalham no campo. Entretanto, as metodologias de Ater Digital são algo recente e estão no início do seu amadurecimento e sistematização. A Ater Digital não significa a ruptura com os caminhos historicamente constituídos das atividades realizadas pelos extensionistas rurais nos seus momentos presenciais no campo. A ideia é o desenvolvimento de atividades que sejam complementares no formato digital.


3. As novas ferramentas da Ater Digital

Além de ferramentas de aplicativos de mensagens como o Whatsapp e de portais de interação, outros mecanismos de capacitação e aprendizagem como chatbots, Educação a Distância (EAD), aplicativos com realidade aumentada e os recursos da internet das coisas com suporte técnico das tecnologias de comunicação 5G revelam o potencial da Ater Digital de ofertar para o produtor um caminho de apoio técnico e educacional significativo no campo.

Quanto às políticas públicas e iniciativas relacionadas à Ater Digital, o Governo Federal lançou em outubro de 2020 o programa de Ater Digital (https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/mda/programa-ater-digital) pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A sua apresentação foi justificada pelos baixos indicadores de alcance do serviço de Ater “nos moldes tradicionais”, onde apenas 18,2% dos estabelecimentos rurais brasileiros recebiam orientação técnica presencial de um extensionista rural.

Algumas referências podem ser consultadas para melhor entendimento do que significa uma Ater Digital, conforme abaixo:

    UEPB - Ater Digital Participativa: metodologias pedagógicas e exemplos de aplicação.
    IDR-Paraná: Programa Ater Digital – Projeto Básico
    Emater-MG: Metodologia MEXPAR - Ater Digital – Conectando Pessoas
    FAO: Guide on digital agricultural extension and advisory services. Use of smartphone applications by smallholder farmers
    Aurora (Rede Latino-Americana de Diálogos em Ater Digital): Ater Digital – Possibilidades, Desafios e Aproximações Conceituais
    CGIAR. CGIAR’s digital extension services  


Por fim, é fundamental também investir em mudança de comportamento e na forma de realizar as atividades dos técnicos e nas propriedades. Assim, investimentos em formação e em capacitação são fundamentais, mesmo em processos digitais, evidenciando que a aplicação de recursos em educação é sempre necessária. Assim, é importante que o avanço da era digital ocorra em consonância com inclusão digital e processos metodológicos educativos da extensão rural, dando espaço para o desenvolvimento e consolidação de processos de Ater Remota e Digital. A participação dos agricultores e técnicos extensionistas no desenvolvimento de sistemas e aplicativos deve ser parte dessas ações.

O CGIAR em seu relatório “Digital Extension Services” alerta que a agricultura está mudando. Os jovens estão se mudando, os produtores rurais estão envelhecendo, as mulheres carregam mais responsabilidades do que nunca, o clima está mudando e os recursos naturais estão diminuindo. Métodos tradicionais de suporte não são mais suficientes. Os agricultores precisam de serviços de extensão que sejam entregues mais rapidamente e em maior escala. Da geração do conhecimento, ao lançamento/disponibilização dos ativos e serviços e à extensão rural, os desafios permanecem na obtenção das informações certas para as pessoas certas no campo. Da validação dos resultados gerados pela pesquisa, à adoção pelos produtores, os serviços digitais de extensão rural oferecem uma grande oportunidade para o desenvolvimento da agricultura.


4. Possíveis aplicações e benefícios para a Embrapa Mandioca e Fruticultura

O objetivo do uso dos mecanismos da Ater Digital pela Embrapa Mandioca e Fruticultura é fortalecer e ampliar a sua atuação, por meio de um modelo inovador, promovendo a ampla utilização de Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) nas ações desenvolvidas pela área, ampliando o acesso dos produtores e parceiros a serviços modernos, ágeis e eficientes, aumentando a sua competitividade.

A Unidade já avançou bastante num curto espaço de tempo no uso das capacitações on-line (EADs). De 2020 até 15/maio/2023), foram 17.551 inscritos nos cinco cursos on-line oferecidos, e desses, 5.019 já concluíram os cursos (implicando 28,6%). Mas seria possível avançarmos mais, por exemplo, considerando os principais polos de produção das culturas que fazem parte do mandato da Unidade e a nossa carteira de cursos já oferecidos e com potencial para serem lançados no curto e no médio prazos. Com quais instituições que já utilizam a Ater Digital poderíamos fazer parcerias?

Onde estão os grupos homogêneos de produtores conectados, com foco também nos nossos produtos? É possível identificá-los? É possível que haja vários grupos formais ligadas a várias instituições como Sebrae, Senar e Organização das Cooperativas do Brasil (OCB). Há também grupos informais de produtores que se integram e organizam por interesses comuns. Para esses casos, seria possível um edital nacional, com um conjunto de requisitos para identificar aqueles grupos que nos interessam?

No âmbito da execução do Projeto Hub da Mandioca, patrocinado pelo Mapa, surgiu a ideia da “Sala VIP”, que já foi, pelos menos provisoriamente, rebatizada de “Sala Virtual”. Será que também não poderíamos abrir uma discussão com potenciais parceiros — de novo, Sebrae, Senar e Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) — para a elaboração de um projeto em conjunto visando captar recursos para uma experiência piloto? O foco seria também os polos de produção das culturas de nosso interesse.

Pela literatura, sabe-se que os assistentes virtuais ou chatbots facilitam o acesso de informações das tecnologias e conhecimentos a produtores rurais. Com base nisso, outra iniciativa recente da Unidade no âmbito da Ater Digital foi um protótipo de chatbot chamado “Mani”.

O objetivo da “Mani” é o atendimento de demandas da mandioca, visando adicionar mais um canal de interação entre a Unidade e os produtores. Os seus potenciais usuários na Unidade são o Setor de Gestão de Tecnologia (STT), Núcleo de Comunicação Organizacional (NCO) e o Núcleo de Ações Estratégicas (NAE). A proposta é que o produtor rural que acessar o site da Unidade, alguma rede social ou apenas o whatsapp possa contar com uma nova ferramenta para encontrar as informações de que precisa sobre a produção ou comercialização da mandioca. A assistente virtual pode ser acessada por meio de clique no avatar ou com o produtor cadastrando o número de conta no seu celular. A “Mani” tem atualmente as seguintes funcionalidades:

    a. Produtor ou parceiro pode informar a sua demanda ou sugestão no whatsapp;
    b. As demandas são registradas em uma planilha Google na nuvem de forma automática;
    c. São geradas consultas gerenciais por meio de um dashboard no Looker / Google Data Studio para consulta da gestão;
    d. O suporte da Unidade informa na planilha a resposta da demanda do produtor, podendo enviar diretamente para o destinatário por meio de um link do whatsapp na própria planilha;
    e. O produtor também pode consultar a qualquer tempo a resposta da sua demanda ou sugestão por meio do whatsapp, bastante informar para a “Mani” o seu número de telefone;
    f. A “Mani” também fornece para o produtor as dicas da semana e as sugestões de publicações da Unidade para a mandioca.


Como próximos passos, pretende-se ampliar a “Mani” para as demais culturas da Unidade, como também adicionar imagens e vídeos, além de funções de voz e de integração com ferramentas de inteligência artificial (exemplo: ChatGPT e Bard).

Por fim, alguns benefícios do uso da Ater Digital pela Embrapa Mandioca e Fruticultura para a transferência de tecnologia e extensão rural abrangem:

   - Maior eficiência na prestação de serviços;

   - Ampliação da abrangência na quantidade de produtores atendidos;

   - Redução de custos no atendimento aos produtores, tanto para a Embrapa como para os próprios produtores;

   - Informações e comunicação mais rápidas e dinâmica entre o Setor de Gestão da Transferência de Tecnologia (STT), extensionistas e os produtores; e

   - Ampliação do uso de tecnologias e inovações nas propriedades rurais que usam tecnologias da Embrapa Mandioca e Fruticultura, com consequentes melhorias nos sistemas produtivos e na produção.

 

Referências consultadas:

CGIAR. CGIAR’s digital extension services.  Disponível em: https://cgspace.cgiar.org/handle/10568/114842. Acesso em 09/05/2023.

EMATER-MG. Metodologia MEXPAR - ATER Digital – Conectando Pessoas. Disponível em: http://www.agricultura.mg.gov.br/index.php/component/gmg/story/3923-emater-mg-lanca-o-mexpar-4-0-destacando-as-ferramentas-digitais-no-trabalho-da-empresa?layout=print. Acesso em: 09/05/2023.

FAO. Guide on digital agricultural extension and advisory services Use of smartphone applications by smallholder farmers. Disponível em: https://www.fao.org/3/cc4022en/cc4022en.pdf. Acesso em 09/05/2023.

IDR-PARANÁ. Programa ATER Digital – Projeto Básico. Disponível em: https://www.idrparana.pr.gov.br/system/files/publico/Transparecia%20Institucional/termosCoopera%C3%A7%C3%A3o/Plano%20de%20Trabalho%20IDR%20Paran%C3%A1%20ATER%20digital.pdf. Acesso em: 09/05/2023.

MAPA. Ministério da Agricultura e Pecuária. Programa ATER Digital. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/mda/programa-ater-digital. Acesso em: 08/05/2023.

UEPB. Universidade Estadual da Paraíba. ATER Digital Participativa: metodologias pedagógicas e exemplos de aplicação. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/sustentabilidade/cesesp/publicacoes/livros/ater-digital-participativa_ebook-1.pdf. Acesso em: 09/05/2023

Zylbersztajn, D; Giordano S. R.; Vita C. L. R. de Ortelan, C. B. A nova assistência técnica agrícola. Cadernos da Universidade do Café. 23-77p. 2020.

 

Gilmar Souza Santos (gilmar.santos@embrapa.br), José da Silva Souza (jose.silva-souza@embrapa.br) e Carlos Estevão Leite Cardoso (carlos.estevao@embrapa.br)
Embrapa Mandioca e Fruticultura

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