22/02/24 |   Fixação Biológica de Nitrogênio

Johanna Döbereiner recebe homenagem no ano em que completaria 100 anos

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Foto: Yasmin Alves

Yasmin Alves -

Pouco mais de uma semana havia se passado do Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, celebrado em 11 de fevereiro e instituído pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura para estimular a presença feminina na ciência, quando a Embrapa Agrobiologia (Seropédica, RJ) sediou, em 20 de fevereiro, a primeira das muitas homenagens que ainda serão realizadas neste ano à cientista Johanna Döbereiner, em razão do centenário de seu nascimento. Pioneira nas pesquisas agronômicas com fixação biológica de nitrogênio e responsável por uma das grandes revoluções na agricultura brasileira – e, por que não dizer, mundial – Johanna é símbolo de resiliência e persistência, tendo se destacado no século passado em um universo predominante masculino.

Com uma mesa de abertura formada por nomes e instituições de peso, o evento de lançamento das comemorações do centenário da cientista reuniu mais de cem pessoas na sede da Embrapa Agrobiologia, na baixada fluminense, onde Johanna trabalhou e viveu a maior parte de sua vida. Majoritariamente feminina, a mesa foi composta por Silvia Massruhá, presidente da Embrapa; Cristhiane Amâncio, chefe-geral da Embrapa Agrobiologia; Helena Nader, presidente da Academia Brasileira de Ciências; Eliete Bouskela, diretora-científica da Faperj; Elika Takimoto, deputada estadual e presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; Renato Janine, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC); e Osvaldo Moraes, diretor do Departamento para o Clima e Sustentabilidade da Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Em suas falas, um denominador comum: a força de Johanna, seu legado e sua representatividade como mulher na ciência.

A abertura da mesa foi feita pela chefe-geral da Embrapa Agrobiologia, Cristhiane Amâncio, que ressaltou a importância da cientista para a formação de recursos humanos críticos e incansáveis. “A cada canto nesta casa a história de Johanna é lembrada, mas não como algo preso ao passado, apenas com saudosismo, mas como forma de reverenciar o que ela tinha de brilhante, sua inquietude na construção do conhecimento científico”, destacou.

A presidente da Embrapa, Silvia Massruhá, enalteceu o trabalho de Johanna e sua importância para a economia brasileira, argumentando, ainda, que a participação das mulheres nos espaços científicos enriquece e contribui significativamente para o processo global de desenvolvimento da sociedade. “Com sua dedicação à pesquisa agrícola, Johanna exemplifica como mulheres inovadoras deixam um impacto duradouro na ciência. Ela foi precursora de uma revolução, a agricultura de base biológica, além de vários outros conceitos que surgiram depois de seus estudos, como bioeconomia, sustentabilidade e mudanças climáticas”, apontou.

A presidente da Academia Brasileira de Letras, Helena Nader, lembrou o pioneirismo de Johanna e, olhando para a mesa da solenidade, ressaltou a maciça presença feminina em sua composição. “Eu imagino o que ela estaria pensando agora, olhando para esta mesa em que os meninos são a minoria”, brincou. “Onde quer que ela esteja, eu a reverencio, pela luta, por ter sido mãe e avó, por ter orientado tantos alunos, por não ter se dobrado.”

Eliete Bouskela, presidente da Faperj, acrescentou: “Fiquei muito feliz quando soube que Johanna foi mãe, pois mostra que uma mulher não precisa abdicar de ter filhos para seguir sua carreira”. Ela destacou a necessidade premente de exemplos para que as mulheres continuem galgando espaço na ciência, para que as próximas não precisem ser as primeiras a desafiar o status quo.

Primeira presidente mulher da Comissão de Ciência e Tecnologia da Alerj, a deputada Elika Takimoto lembrou dos muitos desafios que enfrentou em sua carreira e de sua luta para inserir a diversidade e a presença feminina nos locais de produção de conhecimento. Ela incentiva e comemora a chegada de mais meninas e mulheres na ciência: “Quando a gente luta para colocar mulheres na ciência, a gente luta para que a sociedade seja representada como um todo.”

A relevância econômica dos estudos de Johanna, cujos impactos perduram até hoje, também foi citada pelo presidente da SBPC, Renato Janine: “Temos uma dívida com a pesquisadora, uma dívida econômica e social”, citou. “Um dos pontos principais na defesa da ciência é que sem ela não há desenvolvimento. Como o governo passado não tinha o menor interesse no desenvolvimento social, a gente tentava argumentar com o desenvolvimento econômico, porque um país não vai ter desenvolvimento econômico se não investir em pesquisa científica. Isso é ilustrado perfeitamente no trabalho de Johanna Döbereiner”, completou.

Representando o MCTI, Osvaldo Moraes endossou as palavras de Janine, informando ainda que o Ministério possui uma praça física que leva o nome da pesquisadora e que ainda é um desafio para as mulheres permanecer na ciência, o que precisa ser mudado. “A ciência deveria ser reconhecida como a ferramenta mais poderosa que a humanidade já possuiu”, argumentou.

Lembranças emocionadas são compartilhadas por família, amigos e orientados de Johanna

Os pesquisadores Avílio Franco, Ivo Baldani e Mariangela Hungria, o professor Everaldo Zonta, o jornalista Sérgio Brandão, o empresário Solon Araújo e o filho de Johanna, Christian Döbereiner, compuseram a segunda mesa-redonda do evento de lançamento das comemorações do centenário da cientista. Eles compartilharam experiências vividas com a amiga, orientadora e brilhante pesquisadora, desde sua atuação incisiva nas pesquisas para provar o potencial da técnica de fixação biológica de nitrogênio até sua personalidade forte, mas ao mesmo tempo compassiva e dedicada. “Ela sabia ser incisiva e cativante”, destacou Avílio Franco, que por muito tempo trabalhou com ela na Embrapa Agrobiologia.

Ivo Baldani, que por 25 anos conviveu com Johanna no ambiente de trabalho, lembrou da relevância dos trabalhos científicos da pesquisadora, que ainda hoje é uma das mais citadas internacionalmente. “A consciência ecológica de Johanna era fantástica, ela sempre se preocupava com o uso dos recursos naturais”, pontuou. Da mesma forma, citou o professor Everaldo Zonta, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRR): “Ela foi pioneira em tudo. Espero que as pessoas se inspirem no trabalho dela, para que sejam pioneiras, quebrem barreiras e sigam em frente. A gente ainda tem vários problemas ambientais, muitos dos quais eram preocupação de Johanna, e a gente precisa fazer o que ela fez: conseguir articular para mudarmos pensamentos. E o principal: formar pessoas.”

Emocionada, a pesquisadora Mariangela Hungria, hoje na Embrapa Soja, disse que Johanna ainda hoje é uma inspiração. “Ela conseguia não deixar o laboratório mesmo com toda a carga administrativa e de liderança que tinha. Todos os dias, na primeira hora, lá vinha ela verificar o crescimento das bactérias”, lembrou. “Como mulher, tinha uma intuição sobre pessoas que chegava a irritar a gente. E, para nossa frustração, sempre acertava. E eu admirava, sobretudo, seu senso de justiça. Tratava todos como iguais. E eu nunca a vi duvidar da capacidade de uma mulher por ela ser mãe”, acrescentou. A pesquisadora citou ainda o pioneirismo de Johanna no tema da sustentabilidade, mantendo seus ideais mesmo em um mundo extremamente machista como o da época: “Se hoje se fala em agricultura regenerativa, ela já trabalhava com isso em 1950. E tenho a convicção de que era assim porque era mulher e porque logo se tornaria mãe de três filhos. Mulheres e mães são naturalmente ligadas à sustentabilidade.”

O conselheiro fundador da Associação Nacional dos Produtores e Importadores de Inoculantes (ANPII), Solon Araújo, também lembrou da força de Johanna enquanto sua orientadora. “Não a conhecia e não conhecia Seropédica, onde ela estava com suas pesquisas. Meu professor me preveniu: ‘olha, ela é uma alemã durona, você tem que estudar, viu?’. Mas quando cheguei, vi uma figura alegre e sorridente. Fiquei um mês inteiro com a professora Döbereiner e foi uma época extremamente proveitosa.”

Já no fim da programação do dia, o jornalista Sérgio Brandão, que entrevistou diversas vezes Johanna ao longo da vida para uma série de programas jornalísticos de TV (veja um deles aqui), lembrou o carisma de Johanna e seu comprometimento com a ciência. “Ela era de um entusiasmo contagiante”, recordou. “Tenho quase certeza de que foi comigo sua primeira entrevista para a TV, e ela falava do seu trabalho com empolgação, explicando sobre a fixação biológica de nitrogênio por bactérias e a importância disso para a agricultura”, citou.

Filho primogênito de Johanna, Christian lembrou da garra e da persistência com que a mãe perseguia seus objetivos. “Era comum ela chegar em casa e comentar com entusiasmo sobre as entrevistas que fazia com estudantes”, recordou. “Às vezes a gente a acompanhava aqui na Embrapa, e quando a gente se comportava, ela deixava a gente olhar pelo microscópio.”

Outras homenagens

As ações em comemoração ao centenário de Johanna Döbereiner prosseguirão no decorrer do ano, inclusive com exposição programada no Congresso Nacional. As atividades estão sendo idealizadas por um comitê organizador formado por Embrapa, Academia Brasileira de Ciências (ABC), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Universidade Federal do Paraná (UFPR).

A sessão com as mesas-redondas do dia 20 de fevereiro pode ser conferida na íntegra no canal da Embrapa no YouTube, aqui.

 

Liliane Bello (MTb 01766/GO)
Embrapa Agrobiologia

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