22/06/17 |   Produção vegetal

Produção nacional

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No Brasil, existem registros de cultivo de uvas em regiões tropicais já no século XVI, mas a atividade tornou-se efetivamente comercial a partir de 1956, quando a empresa Cinzano S.A. plantou 100.000 pés de uvas híbridas para elaboração de vinhos no Vale do Submédio São Francisco. 

Mas foi na década de 1970 que a produção de vinhos se tornou mais conhecida, com a implantação da fazenda Milano e, posteriormente, da fazenda Ouro Verde. Na de 1980, os primeiros vinhos tropicais apareceram no mercado, quando a Vinícola do Vale do São Francisco, localizada em Santa Maria da Boa Vista (PE), lançou os vinhos Botticelli. No início dos anos 1990, foi a vez da vinícola Adega Bianchetti Tedesco lançar seus vinhos no mercado, seguida pela Vinícola Garziera e pela Duccos Vinícola.

No início dos anos 2000, a produção foi reforçada com a chegada de grandes investidores, como o Grupo Miolo, da Serra Gaúcha, que comprou a fazenda Ouro Verde, e o Dão Sul/Global Wines, de Portugal, que criou a vinícola ViniBrasil.  Atualmente, além dessas e da fazenda Milano, estão instaladas na região as vinícolas Bianchetti e Garziera e o Grupo São Braz. Segundo levantamento feito pelo pesquisador Giuliano Pereira junto às vinícolas locais, são cerca de 500 hectares de vinhedos que produzem aproximadamente 4 milhões de litros de vinhos finos – além dos vinhos comuns que também começam a ganhar espaço na região –, empregando, direta ou indiretamente, cerca de 3.000 pessoas.

Essa, que é a principal região tropical produtora de vinhos no País, está situada entre os paralelos 8º e 9º do Hemisfério Sul, nos municípios pernambucanos de Petrolina, Lagoa Grande e Santa Maria da Boa Vista, e em Casa Nova, na Bahia, com altitude de aproximadamente 350 m. As condições climáticas da região, com uma temperatura média anual de 26ºC, alta luminosidade e água disponível para irrigação a partir do Rio São Francisco, propiciam ciclos vegetativos constantes, intercalados, com colheitas nos vários meses do ano. A região conta com uma pluviosidade média de 550 mm ao ano, concentrada entre dezembro e abril, quando as vinícolas evitam programar as colheitas, por se tratar do período mais chuvoso. Entre uma safra e outra, para “simular” o frio do inverno, é necessário reduzir a irrigação para 5% a 10% nos períodos secos, por cerca de 20 a 30 dias, para que as videiras acumulem reservas. Na sequência, é feita a poda e a aplicação dos insumos com o objetivo de reduzir a dominância apical, estimular e homogeneizar a brotação. Depois, a irrigação volta para 100% do coeficiente da cultura (Kc), e um novo ciclo produtivo começa.

Assim, dentro de uma mesma área as videiras poderão estar, ao mesmo tempo, em diferentes estágios de produção: algumas recém-podadas, outras brotando, umas florescendo, outras maturando e outras ainda com as uvas prontas para a colheita. Desse modo, os produtos elaborados são sempre jovens, pois os vinhos ficam prontos e são vendidos nos diversos meses do ano, conforme demanda dos mercados nacional e internacional.

O pesquisador Jorge Tonietto, da Embrapa Uva e Vinho, pondera que a possibilidade de produzir uvas e vinhos durante todo o ano estabelece um novo paradigma para a enologia – o just-in-time. “Com uma produção regular de vinhos sendo colocada no mercado ao longo do ano, garante-se aos consumidores que eles sempre tenham à sua disposição vinhos jovens e frescos, valorizando as características típicas dos vinhos tropicais”, avalia.

Além disso, com a produção ao longo do ano, as equipes estão sempre trabalhando, no vinhedo ou na adega, com estruturas de vinificação menores, mais enxutas e com investimentos menores, pois se consegue programar o número de cubas necessárias de acordo com as colheitas, em determinado mês. Essa peculiaridade possibilita, ainda, a geração de empregos permanentes.

Uma única vinícola instalada na região do Vale do Submédio São Francisco, a ViniBrasil, por exemplo, emprega diretamente 120 funcionários, entre campo, adega e escritório, para uma área de 120 hectares em produção e outros 40 em implantação. O enólogo responsável, Ricardo Henriques, ressalta as vantagens de não haver sazonalidade, já que não necessitam contratar para períodos específicos da produção. Uma delas é que os trabalhadores são altamente especializados, pois executam a mesma atividade durante todo o ano, até mesmo recebendo capacitação com os melhores especialistas da área. “No caso das enxertias, por exemplo, os índices de produtividade e de sucesso são superiores aos do nosso grupo em Portugal. É como se fosse uma indústria de produção em série”, observa.

Vinhos do Vale do Submédio São Francisco apresentam qualidade e tipicidade. Segundo o pesquisador Giuliano Elias Pereira, para os espumantes moscatéis, entre a colheita e os vinhos estarem prontos para o mercado são necessários apenas 35-40 dias, o que faz com que esses produtos sejam jovens e os mais produzidos na região, com rápida elaboração. Esses tipos de vinhos caíram no gosto do consumidor por serem produtos com baixo teor alcoólico (entre 7-8º GL) e elevados teores de açúcar. São elaborados a partir das variedades moscatéis Itália e Moscato Canelli.

Da mesma forma, os espumantes finos secos e meio-secos brancos e rosados, elaborados pelo método Charmat, apresentam notas agradáveis de frutos, com bom equilíbrio, e ficam prontos rapidamente também. Estão em segundo lugar em termos de volume e são elaborados das variedades Syrah, Grenache, Chenin Blanc, Sauvignon Blanc e Verdejo.

Em seguida, estão os vinhos jovens, entre tintos secos e doces/suaves, elaborados com as variedades Syrah, Tempranillo e Barbera. Também são elaborados vinhos tintos de guarda (que passam por processo de envelhecimento) em pequenos volumes, das variedades Syrah, Touriga Nacional, Alicante Bouschet e Cabernet Sauvignon. Os tintos jovens são frutados, leves, agradáveis, enquanto os tintos de guarda apresentam coloração muito intensa, aromas frutados com toques de especiarias, intensos na boca, precisando de alguns meses de repouso para consumo. Por último em volume, os vinhos brancos, que são florais, leves e agradáveis, são elaborados a partir de uvas Chenin Blanc, Viognier e Sauvignon Blanc. Também estão sendo elaborados vinhos licorosos e brandy. 


Números do São Francisco:

  • 4 milhões de litros/ano
  • 65% são espumantes (70% moscatel e 30% fino brut e demi-sec)
  • 34% de vinhos tintos, na sua grande maioria jovens e alguns de guarda que passam por um período em barricas de carvalho
  • 1% de brancos
  • 95% são destinados ao mercado nacional e o restante é exportado para países da União Europeia, Ásia e Estados Unidos.

Na vanguarda das soluções

A vitivinicultura tropical mais desenvolvida do mundo encontra-se no Nordeste do Brasil. Segundo o pesquisador Giuliano Elias Pereira, o Brasil está na liderança e na vanguarda dessa nova fronteira vitivinícola, pesquisando e apresentando alternativas para qualificar e inovar ainda mais os vinhos tropicais.

O pesquisador também destaca o papel pioneiro do Brasil ao criar, por intermédio da Embrapa, o principal fórum internacional de apresentação de pesquisas e debates dos países que produzem em regiões tropicais, por meio do Simpósio Internacional de Vinhos Tropicais (ISTW). Realizado de forma itinerante nos países produtores, o evento possibilita uma efetiva e crescente cooperação internacional para essa atividade inovadora. A última edição, o 5º ISTW, ocorreu de 19 a 21 de outubro de 2016, em Petrolina (PE), e a próxima deverá ocorrer em 2018. Pereira pontua que os principais gargalos atuais do Vale do São Francisco são “o aumento da produtividade, os testes em andamento com novas variedades, diferentes sistemas de condução das videiras e o reconhecimento da Indicação Geográfica para os vinhos da região.”

Além disso, segundo Pereira, “trabalhos de pesquisa apontam que a elaboração de vinhos a partir de uvas colhidas nos meses mais frescos do ano, entre o outono e o inverno, poderia melhorar a estabilidade e também valorizar a tipicidade dos vinhos, principalmente tintos e brancos tranquilos, enquanto para espumantes, carro-chefe da região, e vendidos e consumidos em maior escala, a produção em qualquer época do ano é viável.”

Segundo Celito Guerra, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, o clima quente tem a vantagem de proporcionar mais de uma safra por ano. Porém, como desvantagem, ocorre a combustão de alguns compostos durante a maturação da uva, como ácidos orgânicos, aromas e matéria corante. O fenômeno é mais intenso na época mais quente do ano, de agosto a dezembro. Com base nisso, Guerra afirma que as videiras que melhor se adaptam são as que produzem uvas com altos teores de acidez, aroma delicado e, no caso das tintas, com alto potencial para produção de antocianinas e taninos. Atenção especial deve-se dar à maturação da uva, pois é uma fase muito curta e a combustão de ácidos, aromas, polifenóis e outros compostos é intensa e rápida no segundo semestre.

No caso dos espumantes e vinhos brancos, dois dos principais atributos são o frescor aromático e gustativo e a tipicidade aromática varietal. Para isso, ele reforça a necessidade de colher as uvas com acidez relativamente elevada, sem comprometer a riqueza de açúcares. “Uvas muito maduras tendem a apresentar baixa acidez e a perder boa parte do potencial aromático, comprometendo assim a qualidade do produto final, que em vez de frescor aromático apresentará notas de frutas sobremaduras e compotas”, complementa Guerra.

Ele destaca que as condições do clima exigem que após a colheita aconteça o transporte à vinícola, com um rápido resfriamento das uvas para inibir o desenvolvimento de microrganismos nocivos e diminuir a velocidade de reações de oxidação do mosto. Em relação à vinificação, o pesquisador comenta a necessidade de controles rígidos no processo pela menor estabilidade química de certos compostos de uvas produzidas em climas quentes, que afetam diretamente a qualidade, a longevidade e o equilíbrio dos vinhos.

Entre as inovações lançadas e em desenvolvimento no Vale do São Francisco, destaque para os vinhos espumantes rosados, com as uvas Syrah e Grenache, novas variedades em fase de testes para espumantes brancos, vinhos comerciais de guarda e de alta qualidade, como os elaborados com a colheita de uvas Syrah no período de inverno, com o desengace manual das bagas.

Segundo Giuliano Pereira, pesquisas apontam que os engaços de uvas na colheita, na região do Vale do São Francisco, não estão lignificados e ao passarem pela desengaçadeira são quebrados, podendo ir com cascas e sementes para a maceração, possibilitando a extração de taninos verdes, agressivos e amargos, comprometendo o equilíbrio de vinhos tintos. Com isso, o desengace manual tem respondido positivamente à qualidade de tintos de guarda. Da mesma forma, em vinhos brancos de guarda, uvas colhidas no período de inverno no Vale do São Francisco podem melhorar os vinhos, com alta qualidade e tipicidade. 

Cada vez melhores

Por se tratar de uma região vitivinícola relativamente recente, muitas questões ainda provocam a pesquisa na  busca de soluções de problemas e no apontamento de novas alternativas para o futuro da produção tropical brasileira. Nessa linha, a Embrapa tem experimentado diferentes práticas e métodos de vinificação que proporcionem maior qualidade para os vinhos, com inovações para agregar valor ao produto local.

Na busca de soluções para um dos principais problemas da vitivinicultura na região, que é a estabilidade dos vinhos, um trabalho da pesquisadora Aline Telles Biasoto Marques, da Embrapa Semiárido, identificou que o aumento do tempo de maceração – o período em que a casca e as sementes são mantidas com o vinho – pode ser uma alternativa para melhorar a estabilidade dos compostos fenólicos.

De acordo com a pesquisadora, os testes incluíram vinificações com diferentes tempos de maceração de uvas colhidas em diferentes estádios de maturação, avaliando também se a colheita antecipada da uva seria um problema para a estabilidade fenólica. O resultado, no entanto, apontou que ela foi mais influenciada pela duração da maceração, enquanto o grau de maturação da uva não apresentou diferença significativa. Até o momento foram avaliadas três safras com a variedade Syrah, e os próximos experimentos, que estão sendo iniciados, incluem ainda a Touriga Nacional.

Utilizando uvas com maior grau de maturação e elaborando vinhos com maior duração de maceração, a pesquisadora está testando também o uso de chip de carvalho. “Como nossos vinhos em geral são jovens, então estamos propondo um envelhecimento rápido e de baixo custo, que pode ser uma alternativa de um novo produto para a região”, destaca. Qualidade e estabilidade dos vinhos ainda estão sendo avaliadas.

Outros novos produtos também poderão ser propostos em breve para o setor produtivo, utilizando diferentes métodos de elaboração. Nas pesquisas, em parceria entre a Embrapa Semiárido e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambuacno (IF Sertão-PE), estão sendo testados processos ainda pouco usados na região, como a maceração carbônica e maceração a frio, além de um ainda inédito, que é a termovinificação, que consiste no uso de temperaturas elevadas para a extração do mosto. Os estudos comparam esses três métodos, além da vinificação tradicional, analisando as características físico-químicas, composição fenólica e aromática e perfil sensorial.

De acordo com a enóloga e professora do IF Sertão Ana Paula Barros, que lidera o projeto em parceria com a pesquisadora da Embrapa Aline Biasoto, “o que estamos buscando é verificar se existe uma diferença significativa entre os métodos, principalmente na questão da estabilidade dos vinhos, e analisar se vale a pena o investimento para as indústrias, podendo até mesmo ser um diferencial para agregar valor aos produtos.”

Qualidade tem início no campo - Para que um vinho de qualidade chegue à mesa do consumidor, tudo começa no campo. E, como as condições do Vale do Submédio São Francisco são diferentes, é necessário fazer escolhas apropriadas às suas especificidades. “Precisamos escolher as cultivares mais adaptadas, os melhores clones, definir o manejo da água, a condução das plantas, enfim, todo o sistema de produção precisa ser ajustado”, ressalta a pesquisadora da Embrapa Semiárido Patrícia Coelho de Souza Leão.

Para subsidiar as escolhas dos produtores de vinhos da região, é preciso definir as melhores cultivares e porta-enxertos, os sistemas mais apropriados de condução, irrigação, adubação, entre outras práticas agronômicas. Um estudo com essa finalidade avaliou duas cultivares de uva – Syrah e Chenin Blanc –, durante nove safras produzidas em quatro anos, usando seis diferentes porta-enxertos em dois sistemas de condução. 

Entre os resultados obtidos, ainda em fase de finalização, foram observadas vantagens de um sistema de condução, que consiste no crescimento da vegetação em dois planos inclinados, formando um “Y”. De acordo com a pesquisadora, o sistema, ainda pouco utilizado na região, favorece o aumento da área foliar, formando mais ramos, mais folhas e, consequentemente, aumentando a quantidade de frutos. 

“Nossa preocupação era que a produção maior nesses sistemas pudesse reduzir a qualidade do fruto, mas isso não aconteceu. Então possivelmente vamos ter uma melhor resposta de produtividade nesse sistema, sem perder ou até mesmo melhorando a qualidade dos frutos e, em consequência, também dos vinhos”, ressalta a pesquisadora. A comparação foi feita com o sistema mais utilizado na região, que é a espaldeira, em que a vegetação cresce no sentido vertical, como uma cortina.

Quanto aos porta-enxertos, embora os dados ainda estejam em análise, já é possível afirmar que aqueles muito vigorosos, a exemplo do IAC 572, não são adequados para a produção de uvas de vinho, pois há um desequilíbrio entre os desenvolvimentos vegetativo e produtivo da videira. “Ele faz com que a planta produza muitos ramos e folhas e apresenta uma produção menor”, destaca Patrícia.

Os estudos identificaram que porta-enxertos de vigor mediano, como o Paulsen 1103, SO4 e IAC 766, apresentaram melhor produtividade e equilíbrio das plantas, também mostrando bons resultados em relação à qualidade da uva e do vinho. A indicação do mais apropriado para cada variedade, no entanto, ainda necessita da conclusão das análises.

A indicação das cultivares mais adaptadas às condições do Vale do Submédio São Francisco também está sendo analisada pela Embrapa Semiárido, por meio da comparação entre 13 diferentes uvas viníferas de importância econômica no Brasil e no mundo. Entre as cultivares testadas estão algumas das principais variedades utilizadas na região – Syrah, Tempranillo e Cabernet Sauvignon para vinhos tintos e Chenin Blanc e Sauvignon Blanc para brancos –, e outras ainda sem tradição local, como Merlot, Malbec, Petit Verdot e Grenache, para tintos, e Chardonay para brancos, além de três seleções do programa de melhoramento genético da Embrapa.

Entre os principais resultados obtidos, a pesquisadora aponta a confirmação do potencial e da elevada qualidade da uva Tempranillo, com vantagem em relação à Syrah, que é atualmente o carro-chefe da vitivinicultura local. Outras com elevado potencial enológico, como a Merlot e a Malbec, não alcançaram produtividade economicamente rentável para as vinícolas. “Isso não significa que essas uvas não possam ser produzidas aqui, mas sim que, havendo interesse em investir nessas cultivares, é necessário buscar clones superiores e mais produtivos”, ressalta Patrícia.

Além disso, também foi identificado o excelente potencial de uma das seleções da Embrapa para desenvolvimento de uma variedade visando a elaboração de vinhos brancos comuns, já que não são da espécie Vitis vinifera, mas sim híbridos. “Sua vantagem é principalmente do ponto de vista agronômico, pois é produtiva e resistente a doenças, e ainda mantém o potencial enológico elevado, com qualidade similar à dos vinhos finos”, destaca a pesquisadora. 

Tropicais de altitude

Além do Vale do São Francisco, outras regiões de clima tropical, mas de altitude, estão começando a se destacar. É o que ocorre na Chapada Diamantina, no Estado da Bahia, além de São Paulo e Minas Gerais, que vêm produzindo uvas e vinhos nos últimos oito anos, entre 900 e 1.300 m de altitude. Segundo Giuliano Elias Pereira, nessas condições, a altitude compensa a latitude, oferecendo um clima com temperaturas mais amenas ao longo do ano. Na Chapada Diamantina, principalmente nos municípios de Morro do Chapéu e Mucugê, localizados entre 1.000 e 1.200 m de altitude, a temperatura média anual é de 19ºC e o uso da irrigação é obrigatório.

A vitivinicultura tropical de altitude vem se desenvolvendo rapidamente, e tende a ser uma nova referência no mundo dos vinhos. Os primeiros vinhos comerciais deverão estar no mercado em 2018, mas desde 2010, a Embrapa vem realizando estudos com testes de variedades nesses dois municípios. Segundo Pereira, os principais vinhos em que as empresas estão investindo são espumantes elaborados pelo método tradicional, com a segunda fermentação na garrafa, com as variedades Chardonnay e Pinot Noir, além dos vinhos tintos, elaborados a partir das uvas Syrah, Malbec, Cabernet Franc e Pinot Noir, e brancos, com Chardonnay e Sauvignon Blanc. 

“Os vinhos da Chapada Diamantina têm apresentado qualidade e tipicidade muito interessantes, e os consumidores terão grandes surpresas”, destaca Pereira. Além do excelente nível tecnológico dos produtos, o pesquisador comenta que estão sendo criadas infraestruturas enoturísticas, que podem atrair muitos visitantes e enófilos.

Em um futuro próximo, outras regiões de altitude do Nordeste brasileiro poderão também ser incluídas no roteiro dos vinhos. É o caso do município pernambucano de Garanhuns, a cerca de 900 m de altitude, onde a Embrapa Semiárido introduziu e vem avaliando as primeiras cultivares de uva para vinhos, em parceria com a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e o Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA). 

De acordo com a pesquisadora Patrícia Coelho de Souza Leão, a região é uma bacia leiteira, sem nenhuma tradição vitivinícola. “Isso é um desafio muito grande, porque nós podemos estar ofertando uma nova alternativa, não só agrícola, mas também do enoturismo, já que é uma localidade com clima de altitude e com forte potencial turístico”, observa. 

Até o momento, foram identificadas as variedades que se adaptam à região e estão em fase de vinificação os primeiros vinhos elaborados a partir das uvas produzidas na área experimental. De acordo com a pesquisadora, também há interesse de pelo menos um empresário local na implantação de uma área comercial, que deve contar com o apoio das instituições envolvidas na pesquisa, utilizando como base os resultados nela obtidos. 

Já nos estados de Minas Gerais e São Paulo, tradicionais produtores de café, surge uma nova vitivinicultura, que usa o método da dupla poda, desenvolvido pelo engenheiro-agrônomo Murilo de Albuquerque Regina, pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). A técnica diferenciada é caracterizada por uma poda em agosto, como normalmente ocorre no Hemisfério Sul. Só que a poda, nessa nova técnica, é para a formação dos ramos, cujas uvas são descartadas entre novembro e dezembro, no início da estação das chuvas. Já a segunda poda, dessa vez de produção, acontece em janeiro e a colheita em junho-julho, em função das variedades, em condições de inverno seco, com dias quentes e noites frias, o que contribui para a qualidade da uva e para a tipicidade dos vinhos. 

Em busca da Indicação Geográfica

São quase 50 anos desde os primeiros projetos de elaboração de vinhos nas áreas de clima tropical do Semiárido e a experiência e o acúmulo de conhecimento gerados pelos empreendedores da região, em colaboração com a pesquisa, reforçam a imagem da agricultura brasileira como inovadora, capaz de encontrar soluções para problemas complexos, abrindo novas oportunidades na faixa tropical do globo.

Em 2002, por demanda do setor produtivo local, a Embrapa Uva e Vinho e a Embrapa Semiárido começaram um projeto de pesquisa com o objetivo de desenvolver tecnologias para a produção de vinhos de qualidade com tipicidade regional. "Além de estarmos testando novas cultivares para qualificar os espumantes, que representam 70% da produção atual e são os mais apreciados da produção do Semiárido, estamos avaliando diferentes sistemas de manejo para aumentar a produção e também avanços no processo de elaboração de vinhos tintos, como a retirada manual do engaço, que qualifica ainda mais os produtos", informa o pesquisador Giuliano Pereira.

O grupo também trabalha na estruturação da Indicação de Procedência (IP) do Vale do Submédio São Francisco para vinhos finos tranquilos e espumantes, iniciativa sob a coordenação dos pesquisadores Jorge Tonietto e Giuliano Pereira, cujos trabalhos deverão estar concluídos ainda em 2017 para encaminhamento ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). "Essa será a primeira indicação geográfica (IG) de vinhos tropicais do Brasil e a primeira do mundo equivalente ao padrão europeu, possibilitando a qualificação dos produtos com padrões de identidade típicos do Semiárido brasileiro, onde a produção de uvas e vinhos ocorre durante todo o ano, viabilizando a promoção dos vinhos tropicais por meio das vinícolas integrantes do Instituto do Vinho do Vale do São Francisco (Vinhovasf)", informa Tonietto. 

No âmbito do projeto está sendo feita a delimitação geográfica da área de produção da futura IG, com base no zoneamento edáfico e climático, no relevo e no uso do solo, que inclui as áreas de vinhedos e das vinícolas. Estão sendo feitas a caracterização da qualidade química e sensorial dos vinhos, a descrição da tipicidade dos produtos, com base na viticultura e enologia regionais, e a caracterização e a valorização da paisagem e do enoturismo. E, ainda, com a participação dos produtores, está sendo elaborado o Regulamento de Uso, documento que estabelece padrões de produção a serem adotados para os vinhos que receberão o selo de Indicação de Procedência na região.  

A indicação geográfica, além de valorizar os territórios vitícolas brasileiros, reforça a reputação do vinho brasileiro, servindo para qualificar sistemas de produção de uvas e vinhos, diferenciando a indústria vinícola nacional.

Segundo Mauro Zanus, chefe-geral da Embrapa Uva e Vinho, a estruturação da Indicação Geográfica permitirá atribuir um ”sentido de lugar” à produção local. “Os consumidores de vinhos percebem a qualidade considerando, além dos elementos da cor, aroma e sabor, todo o entorno dos produtos, sendo a vinculação dos vinhos com a peculiaridade do 'lugar Semiárido' um diferencial que, certamente, será valorizado pelos mercados”, assinala Zanus. •

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Fernanda Birolo
Embrapa Semiárido

Viviane Zanella
Embrapa Uva e Vinho

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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